segunda-feira, 30 de dezembro de 2019

O que significou o socialismo real

Os meus artigos se imbricam uns nos outros e este particularmente com aquele em que defini a minha posição final sobre Lenin e a revolução russa:lá eu disse que foi uma precipitação a revolução;me inseri no grupo de pessoas que pensa assim.
Isto traz consequencias de todos os níveis,mas em um aspecto devo tratar com cuidado porque ainda mexe com o problema do socialismo e as suas promessas.
No final das contas o que esta forma de revolução e socialismo prometiam era sacrificar pessoas supostamente culpadas em favor de pessoas injustiçadas pela fome e pela miséria.
Nunca houve preocupação quanto à questões morais e juridicas.Se era certo ou não matar a burguesia ou quem praticasse alguma forma de exploração.
Mas a história mostrou que tais desatinos têm uma consequencia,uma vez que,inclusive,nem sempre as classes altas foram vítimas da vingança revolucionária...
Mas por um principio de auto-defesa revolucionária,de valores tidos como justos,desde de Sain-Just na Revolução Francesa,o direito foi mandado às favas na hora H e isto predominou na revolução russa.Mas o mecanismo é sempre o mesmo:em nome de algo maior e melhor é justo matar e destruir.
Contudo isto não garantiu a sua permanência e nem deixou de ter efeitos nos sonhos futuros,pois todos associam o socialismo com ,pelo menos, a possibilidade real de haver mortos e feridos e não há como trocar os mortos e feridos do capitalismo pelos do socialismo.

sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Não existe politico sentado







A imagem clássica de Karl Marx sentado numa cadeira escrevendo verdadeiras biblias,como o O Capital,é a sintese de sua vida:ele começou com a “ Miséria da Filosofia”,depois passou para a “ Contribuição à Crítica da Economia Politica”,sem falar em outros textos menores,como “ Salário,Preço e Lucro” e no final ficou dez anos para escrever e publicar O Capital.
Marx nunca foi um intelectual de gabinete por vontade própria,como a direita diz.A direita se refere às ideias de Marx,transformadas em politica por Lênin,junto com Stalin o “ grande culpado”.Mas Marx construiu a Internacional e se inseriu no processo politico a vida toda.
Contudo,como tenho feito uma análise da profissionalidade em geral,principalmente em figuras interdisciplinares como Marx,Leonardo da Vinci,Crhristian Huygens,entre outras,uso este exemplo para mais uma vez aprofundar a minha análise e construir um perfil psicológico(entre outros)de Marx,este “ personagem” que me segue(ou eu o sigo?)a vida toda.
Estes interdiciplinares incorrem frequentemente naquilo que Sartre chama de inabitabilidade.Pessoas que se desdobram e se dispersam tanto que às vezes fazem certas coisas com um nível de volatilidade e descomprometimento,próprio daquele que corre demais,embora dotado de grande capacidade e inteligência.
Sartre diria:” toca as coisas mas não as habita”.
Esta característica de personalidade que Freud analisou muito bem no seu texto famoso sobre a infância de Leonardo da Vinci(que eu analisarei também proximamente),se vê claramente também em Marx e compromete não raro a profissionalidade de alguns de seus trabalhos,que já citei em outros artigos.
Aqui eu não falo em trabalhos escritos mas na atividade politica de Marx.A atividade politica ,como qualquer atividade pode se profissionalizar desde que requisitos prévios e básicos estejam presentes:a referida habitabilidade;a utilidade para outrem do fazer;o compromisso permanente ,tudo isto convergindo ,entre outras coisas para um desejo de fazer,um interesse de fazer,que,não raro,se transforma em amor,ou já nasceu como tal.Amor e afeição.
Não existe politico sentado.Uma vez perguntaram a Ziraldo se ele tinha interesse em fazer politica,já que era (e é) tão opiniático(principalmente no tempo da abertura) e ele redarguiu acertadamente que para ser politico é preciso sê-lo integralmente,porque se seu adversário se dedicar 24 horas por dia você terá que fazer o mesmo,sob risco de ser superado por ele.Eu tenho algumas críticas a esta assertiva,porque acho que há equivalentes e alternativas a isto,mas não vou falar disto agora.
O fato é que trivialmente a politica exige uma entrega e certas atitudes que uma pessoa que estuda 8 horas por dia durante trinta anos não adquire ,ainda que tenha vocação e gosto.
A minha iniciação como comunista no passado,se deu lendo a biografia de Jorge Amado,a “ Vida de Luis Carlos Prestes”.Neste livro não tem muita coisa para traçar o perfil do “Cavaleiro da Esperança”,mas com o tempo fui compreendendo os segredos da liderança de Prestes,que lhe conferiu ligação definitiva com a Coluna,coisa que alguns até hoje constestam,chamando-a não só de “ Coluna Prestes”,mas de “ Coluna Prestes/Miguel Costa”,havendo nisto não pouca razão.O que conectou Prestes à Coluna foi que ele perrcorria e resolvia todos os problemas cotidianos da tropa,angariando assim a sua afeição e reconhecimento,condições essenciais de toda a liderança.
Anos atrás um documentário sobre o filme de Oliver Stone “ Alexander”,mostrou como o ator Colin Farrel criou o seu personagem.O documetário intitula-se “ Becoming Alexander”” “Tornando-se Alexander” e nele vemos como o ator vai progressivamente se comportando como uma liderança militar e politica interessada no reconheciemnto e na legitimação dos seus comandados.
Um politico,por mais cinico que seja,como representante que é de uma sociedade ou de um setor dela,não pode se afastar de suas bases e em determinado momento ,a contragosto até,tem que obedecê-la,como aconteceu com Alarico em 410 depois de Cristo,no saque de Roma:Alarico só aceitou saquear Roma,para não ficar contra o seu povo,que faminto e com raiva da cidade queria entrar nela.Por ele mesmo ,que tinha boas relações com o governo,não faria,mas na análise dos prós e contras preferiu manter a sua ascendência sobre o seu povo.
Marx nunca teve nenhum laivo de compreensão destas coisas.Acreditava que a explicação científica e racional da realidade conduziria a classe escolhida por ele aos objetivos por ele preconizados.
Foi este descolamento psicológico e profissional de Marx da politica que o separou erradamente de Lassale,politico profissional que diante da proposta de previdência de Bismarck não teve ,como Alarico,condições de rejeitar,já que a classe operária alemã estava propensa (e necessitava)a aceitar.
É muito raro um politico ser ao mesmo tempo intelectual,no mesmo nível.Eu só cosnigo pensar em um,assim mesmo em condições históricas muito especiais:o Imperador Romano Marco Aurélio.Mas ainda que nestas condições,conseguiu ser um politico de alto nível e um intelectual filósofo realmente,sendo um dos maiores filósofos estóicos da história,cujos conceitos influenciaram o cristiansmo.Alguns autores dizem que Marco Aurélio é um filósofo pré-cristão.A frase do genesis ,contida na Vulgata latina,traduzida por São Jerônimo,outro pensador estóico,” memento homo ,quia puvis est e ad puulverem reverteris”,” lembra-te homem ,que és pó e ao pó retonarás”,teria vindo das leituras das meditações de Marco Aurélio,feitas pelo padre da Igreja.
Lênin foi o que mais perto chegou disto,mas a sua obra é toda condicionada pela politica.Talvez,lembrando uma análise feita por Carlos Nelson Coutinho no sindicato dos professores na década de 80,o texto “ O Estado e a Revolução”,possa ser tido como uma dissertação de mestrado,mas isto é uma discussão.
Marx não era um politico profissional nem muito bom.

quarta-feira, 20 de novembro de 2019

O marxismo e a Reforma Protestante

Um contorcionismo

Embora Marx não seja propriamente um precursor de Max Weber tratou(um pouco) do protestantismo na sua análise do capitalismo.O papel do protestantismo e de Lutero na evolução do capitalismo está presente em Marx desde os manuscritos econômico-filosóficos.
Dentro de sua visão de jovem ,Marx antecipa algumas de suas concepções:a reforma protestante ajudou o desenvolvimento do capitalismo,condição objetiva de construção do socialismo e do comunismo.
Contudo a relação com o dinheiro,por Marx,não é admitida porque ele coloca o objetivo de superação revolucionária do capitalismo numa perspectiva quase que imediata,pela revolução.
A supressão do capitalismo acabaria com o dinheiro,com o entesouramento,em favor de uma sociedade solidária e que coloca a sua finalidade na relação desalienada do homem com o homem.
Neste aspecto ele é totalmente diferente de Weber e entende o dinheiro como barreira alienante do homem e nisto ele se aproxima do catolicismo,do cristianismo primitivo,que ,afinal é a origem histórica do comunismo moderno:Marx não é criador sozinho do comunismo;ele aderiu a um dos tantos grupos que já pululavam na Europa desde o século XVIII e ofereceu a sua versão “ científica”.
Depois do fim da Guerra dos Trinta Anos,a Europa buscou uma utopia,através do setor avançado da Contra-Reforma católica,os jesuítas,na América Latina ou em regiões não tocadas pela barbárie recorrente dos europeus.
O comunismo também faz parte da tradição judaico-cristã:a única organização de massa na História é a religião.Qualquer pessoa que esteja acuada vai numa delas e tem ao seu dispor milhares de pessoas dispostas a ajudar.Quer mais comunismo do que isto?
Todas as comunidades visitadas por São Paulo eram “ comunistas”,no sentido básico do princípio “ da cada um segundo a sua capacidade,a cada um segundo a sua necessidade”,conforme fixado pelo iluminismo alemão e seu maior representante,Lessing.
Isto se pode encontrar no âmbito de qualquer grupo religioso,mas Marx,que é nosso assunto aqui,muito embora quisesse colocar o protestantismo como parte essencial do progresso da humanidade,caía na regressão do catolicismo,ao repelir o dinheiro.

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Relações entre idéias e matéria em Marx

Eu sempre tenho que esclarecer aquilo que digo aqui,principalmente neste tema.Quando digo que as idéias são essenciais no processo de mudança,não estou dizendo necessariamente que para se chegar à utopia é preciso escola(antes da economia),embora esta mediação seja essencial.
O problema é complexo:o que disse,seguindo uma tradição crítica da revolução russa, é que ficou evidente que sem pré-condições subjetiva e objetiva,toda tentativa de implantar o socialismo e o comunismo redunda em ditadura permanente e barbárie.
A exigência desta condição implica em uma sociedade industrial em que o trabalhador dispõe de conhecimentos prévios capazes de fazê-lo trabalhar em prol da superabundância de bens.Não há como obrigar um camponês acostumado em gerações a usar o arado,a usar um computador de uma hora para outra.
Também os valores das pessoas jogam um peso decisivo.As distinções feitas por Max Weber entre a mentalidade católica e protestante têm um significado considerável.
Isto não impede de modo algum que se busque discutir em determinados contextos só o problema econômico,mas com a resolução prévia destas premissas.
Num país como o Brasil é claríssimo que só vai haver desenvolvimento se houver educação,porque o povo brasileiro está excluído da escola e não pode competir com outros países,em que o sistema educacional é melhor.
Acaso isto não é o predominio das ideias sobre a economia?Tem isto em Marx?Claro que não.
As relações entre as idéias e a matéria são as mesmas do marxismo com a sociologia,com o método descritivo-compreensivo:ambos têm o seu lugar e colaboram,mas há certas coisas que só com uma ou com outra.
No caso das idéias só a sociologia dá uma resposta coerente e real.Marx é um dos fundadores da sociologia quando fala na “ Ideologia Alemã”,” nas relações materiais de produção” que sustentam as condições materiais de existência(na parte referente a Feuerbach),mas se esqueceu da troca simbólica,do fenômeno associativo,desvelado por Comte,o verdadeiro criador desta disciplina,a “ ciência” da sociedade.

sexta-feira, 11 de outubro de 2019

As causas da 2a Guerra

Todos os historiadores são unânimes em dizer que o Tratado de Versalhes foi o grande responsável pelo revanchismo da Alemanha,a partir de 1919,que levou ao nazismo e à segunda guerra mundial.
Mas existe outra coisa que os historiadores não falam:o peso da revolução bolchevique na eclosão do fenômeno.
Se a historiografia soviética sempre afirmou que Hitler só conseguiu seguir no seu projeto,sem ser impedido,por explorar o anti-comunismo da Europa,porque não pensar que se os comunistas não estivessem na Rússia,não seria mais dificil a agressão àquele país?
O périplo agressivo de Hitler,a historiografia soviétiva tem razão,só foi possível convencendo as elites européias de que era preciso eliminar os comunistas do continente e da Rússia.
As potências ocidentais costumam dizer que a constatação de que Hitler era só um imperialista se deu com a invasão da Tchecoeslováquia em agosto de 1939,pouco antes da eclosão da guerra propriamente dita ,em setembro deste mesmo ano.Mas se tivessem responsabilidade teriam visto isto antes e mais responsavelmente,teriam evitado que esta constatação se revelasse mais clara com a Barbarossa,porque lá,na Rússia, ficou claro que não se tratava apenas de depor os coumnistas,mas de eliminar a Rússia,como pátria dos eslavos,considerados inferiores pelos nazistas.
A “ ingenuidade” dos ocidentais gerou também ,no espirito de retaliação de Versalhes, a segunda guerra,mas se os comunistas não estivessem estacionados lá em Moscou,teria sido possível fazer uma guerra em nome da inferioridade dos eslavos ou da defesa do povo alemão,que se sentia ameaçado pela “ barbárie” russa,bolchevista?
Sim,porque como eu já mostrei em outros artigos, houve duas tentativas de exportar a revolução russa para a Alemanha,por Lênin,a primeira em 1919 através da Hungria,com a ajuda do comunista Béla Kun,e a segunda e última através da Polônia,no que ficou conhecida como guerra russo-polonesa,em 1920,rechaçada pelo marcehal Pilsudski.
Embora com estas duas derrotas ,a cultura comunista e bolchevique,ao longo dos anos 20 e 30,teve uma influência quase que prioritária na Alemanha,ajudando os nazistas a brandir a ameaça do “ perigo vermelho”,até ao incêndio do Reichstag.
A minha conclusão é que a presença da URSS também contribuiu,juntamente com o Tratado de Versalhes,para guindar os nazistas ao poder para desencadear afinal a 2a Guerra.

quinta-feira, 1 de agosto de 2019

Marx era filósofo?

Eu tenho sido tão criticado por fazer certas afirmações sobre Marx que resolvi voltar ao tema das qualificações profissionais do pensador e começo exatamente daí:a distinção entre um pensador e um filósofo.
Ao longo da vida,desde , perguntava o que era a filosofia e a resposta era sempre esta:não se preocupe com isto meu filho porque a maioria dos filósofos não sabe,pois cada um dá uma definição própria, diferente da dos outros.
Perseverei,no entanto,a vida toda e encontrei uma definição que eu considero profissional na professora Katia Muricy,que em seus manuais diz assim:” a filosofia é puramente pensamental;a filosofia(profissionalmente considerada[digo eu])é grega,foi criada pelos gregos.Continua Katia Muricy:”ela relaciona idéias em si mesmas e constrói um discurso”;” estas idéias são mais ou menos inter-relacionadas””constituindo um sistema de pensamento”.
No passado a única coisa que unificava a todos na busca de uma definição da filosofia e do filósofo era a sistematicidade deste saber(não uma ciência),mas ,como vemos,existem outros fundamentos no caldeirão de sua caracterização.
Todo filósofo é um pensador,mas nem todo pensador é um filósofo.No sentido profissional próprio,que fundamenta a sua profissionalidade, filosofia é isto,puramente pensamental.
Mas como todo saber e toda a produção cultural humana,aquilo que acrescenta algo de novo ou de distinto(já que ex nihilo nihil )é de se destacar,de se definir.
Conforme disse em outros artigos,muitas afirmações são comuns a muitos pensadores e produtores culturais.Aquilo que cada um descobre ou produz de distinto é que faz a sua fortuna crítica,mas certas ideias são comuns a muitos.
Se Rafael Sanzio tivesse morrido em 1490 ele não teria nenhuma importância.Foi só quando abraçou a técnica do afresco tirada de Michelângelo que se tornou històricamente conhecível e reconhecível.
Há um crítico americano que faz uma afirmação que muito jumento aí não aceita:Orson Welles era basicamente um realizador.Não tinha ,nesta condição,”criatividade”,conteúdos,que lhes eram dados pelos roteiristas ou textos que usava.As maiores obras de Welles são baseadas em Shakespeare,em livros clássicos ou em roteiros,como o de “ Cidadão Kane”.Se tivesse feito só “ Verdades e Mentiras” ou “ Condessa de Shang Hai” só teria importância como criador de imagens,um realizador.
Aqui no Brasil,como relatei e vou relatar de novo,Josué Montelo escandalizou muita gente,na época da exibição pela TV Globo,da adaptação por Walter Avancini de “ Grande Sertão-Veredas”,ao dizer que Guimarães Rosa só era importante pela linguagem,não necessariamente pelos conteúdos.
É assim que penso em relação aos autores como Marx.Nunca disse que ele não era filósofo,mas alguns de seus textos são abordados como filosofia sem o ser.
Os saberes são distintos mas a realidade os une.Pode se fazer uma discussão axiológica e sociológica ao mesmo tempo(e filosófica,politica,etc,etc.),como ele faz em A Ideologia Alemã;pode se fazer uma análise filosófica e econômica,como nos Manuscritos Econômico-Filosóficos ou nos Grundrisse,mas os saberes são distintos,são coisas diversas.
A obra de Marx é um amálgama destes saberes,unidos,segundo ele,pela dialética ,com a exceção talvez de a Sagrada Família.Neste livro se observa a contribuição filosófica real de Marx,que o torna filósofo:o materialismo é aplicado ao mundo social real.O que ele acrescenta é isto,na história do materialismo:ele o aplica na vida social.
Mas os Grundrisse não podem ser considerados estritamente de filosofia,como muita gente diz.Certo,ele se refere ao “ concreto de pensamento”que nada mais é do que um aprofundamento do método dedutivo-racional de Aristóteles:ele quer dividir o mundo social real até encontrar o concreto mais individualizado possível,mas,como eu já disse,isto é impossível.
O que é uma abstração vazia?Uma ideação sem correspondente no real?Vou retornar a estes problemas:quando se idealiza um ser,uma mulher,por exemplo,é lógico que a forma que a subjetividade idealiza não se adequa porque o tempo,imediatamente,a modifica inexoravelmente.Uma abstração é feita para extrair padrões comuns às coisas.Se digo fruta,sei que não existe uma fruta destacada,mas várias “ frutificações” com caracteres comuns.Isto não é uma forma de “concreto de pensamento”?
Abstração vazia são os trancendentais como DEUS(São Tomás de Aquino);a geometria de Platão ou as figuras geométricas de Kant,apreendidas pelos Juízos Sintéticos A Priori(o apriorismo de Kant é uma tentativa frustrada de criar um idealismo separado do real,da experiência humana[definir o mundo previamente,sem o seu concurso ,é um objetivo quimérico de Kant]).
Como eu disse em outros artigos que relembro agora,às vezes o que um autor diz não faz o sentido que ele deseja.Neste último caso de Kant,ele intenta uma idealização,mas o reconhecimento da união da razão com a percepção e a sensibilidade,na consciência subjetiva o desmente.Às vezes um autor é datado e é traído pelas condicionantes de seu tempo.Por isso o temor reverencial a um autor é prejudicial ao progresso.Imagine se Galileu tivesse este temor diante de Aristóteles e sua risivel “Physica”?
Hegel se refere à “ Razão Universal”,fato que levou Marx e outros a chamá-lo de idealista,mas ele está falando sobre a “Physis”,o Ser em geral.A razão universal é uma abstração vazia,porque ela não abarca o mundo todo.Propô-la filosoficamente é idealismo,mas não é bem isto o que Hegel diz.
Então Marx é um pensador porque aborda muitos saberes.Mas nem sempre é profissional,embora dê contribuições como pesquisador e estudioso.
O fato dele pesquisar um livro como a “ Filosofia do Direito” de Hegel não o torna advogado.E as contribuições de sua crítica a este texto são religiosas:” O respiro da criatura oprimida,o coração de um mundo sem coração” e os fundamentos de suas reflexões,que atraíram Engels, são Feuerbachianos(Feuerbach,que por sua vez se inspira num Pré-socrático:Xenófanes de Colofão).Fora isto não tem nada.E o que ele acrescenta é a visão de classe(ausente em Feuerbach).
Ler um livro jurídico não o torna advogado,precisa de mais coisa para ser profissional.
Porque Marx não foi professor de filosofia?Bruno Bauer prometeu a ele um lugar na Universidade,mas perdeu o seu lugar e não pode cumprir a promessa.Isto aconteceu porque Bauer não ia discutir a relação alma/corpo,como Marx também.Quando Bauer se recusou a tratar destes assuntos foi excluído para sempre.Acaso Marx ia fazer estas discussões terológicas?Mas ele não tinha a compreensão do que falamos acima,do caráter profissional da filosofia,que é grega.Então invectivou contra esta matéria,inquinando-a de idealismo e de desimportância.Dizem que esta frase:”a filosofia está para a vida,como a masturbação para o sexo”é dele(não pude confirmar),mas a filosofia,depois do fim da Grécia,se tornou uma mistura amadora de questões ideológicas e politicas,em grande parte discurso de poder.Foi com isto que ele tomou contato.
Hegel foi tido por uma banca examinadora,como “ inapto para a filosofia”,mas esta avaliação entra nesta melèe aí:o que era filosofia na época?A filosofia se profissionalizou em alguns autores e no século XX tomou novo impulso neste aspecto.
O fato de Marx acrescentar algo ao materialismo(o materialismo histórico[resignificado])o torna um profissional?Talvez sim,mas esta contribuição só não é suficiente.
Marx era profissionalmente um economista,um pesquisador em diversas áreas,filósofo(viram?),pensador,um publicista,um jornalista e poderia ser mais coisa.Marx é uma das pouquíssimas pessoas que transitaria em alto nível pelas ciências humanas e as ciências naturais.Eu achava e acho Marx um gênio,mas pensava que ele era como todo estudioso da sociedade: limitado aos saberes sociais,mas vi uma vez na “ Dialética da Natureza” uma observação de Engels a respeito de sua condição de “ matemático consumado”.Pensava eu que os cálculos de “ O Capital” não eram dele,mas eram e recentemente foi descoberto um texto dele sobre cálculo integral e diferencial que habilitaria Marx,se ele tivesse caído entre aqueles físicos do século XIX,a chegar à relatividade...
Mas Marx,por limitação de época,não conheceu a sociologia e comete erros nesta área e como politico era muito ruim(eu vou falar sobre isto em outro artigo).
Como Freud(outro judeu)ele tem um natureza profissional e uma condição de pensador/pesquisador que aborda tudo e tira conclusões úteis,mas nem sempre profissionais,ou suficientemente profissionais.Freud,psicanalista ,influencia outras profissões,como pensador das consequencias do seu trabalho no mundo.Marx também.
Marx ,como aponta Isaiah Berlin,era obsessivo e um Leonardo Da Vinci:dividia o seu escritório com cordas,cada uma separando um lugar próprio de um saber.Economia,História,Politica.Aliás é conhecido o texto histórico de Marx sobre Bolivar,muito ruim.Quem diz isto é Perry Anderson.Marx era péssimo historiador,embora tenha oferecido novos conceitos para ela.
Marx e Da Vinci são figuras ciclópicas,gênios,mas não acertam sempre.Assunto para outro artigo.

sábado, 20 de julho de 2019

Uma descoberta pessoal

artigo dedicado à Radio Tupi e à folha de São Paulo.

A direita costuma usar Marx de diversas formas,para desmoralizar a esquerda em geral.Uma das questões mais recorrentes é atribuir a Marx o caráter de um plagiador de outros autores e isto é em grande parte verdade,mas a direita,tanto quanto a esquerda ,plagia.
Eu,por exemplo,sou muito plagiado.O ter publicizado a carta de Freud sobre o menino homossexual,rendeu um monte de gente que usa esta “ descoberta”,que já fora publicizada por Jurandir Freire Costa na década de 80 e que já era conhecida há pelo menos sessenta anos!No artigo que escrevi deixei tudo isto claro:em momento nenhum reinvindiquei originalidade.Apenas fiz pesquisa e comentários sobre esta carta,prcurando trazer fatos novos,procurando fazer novas descobertas,se possível.
Isso rendeu uma repercussão na Globo News ,no tempo da Copa da Rússia e agora psicanalistas radiofônicos a usam,do mesmo modo que eu.Não tem problema neste caso.
Mas em outros a coisa se torna mais séria e eu aqui uso um exemplo tirado da vida intlectual de Marx:muitas idéias de Marx ele as tirou de outras pessoas.
No primeiro volume de “ A Ponte”escrevi um artigo sobre a personalidade de Marx.Quando Lassalle conheceu Engels e as suas idéias ele disse ao segundo que “ iria apresentá-lo a um homem que era mistura de Voltaire e Lessing” e eu frisei que tal revelava muito do que Marx era:semelhante a Voltaire,que não possuía uma filosofia original,mas usava idéias de outros para construir um pensamento.
Isso se aplica a Marx e a pessoas do mundo radiofônico e à direita:de fato Marx era muito colador.Ele reorganizava idéias e dava-lhes um outro sentido,dentro de um outro sistema.
Isto ocorre quanto à “ sua” concepção de “ ditadura do proletariado”.Numa carta famosa a Kugelman ele se refere à “ sua” concepção,mas o conceito de ditadura do proletariado veio se desenvolvendo até o tempo dele,desde a Revolução Francesa.
No periodo que vai de 1792 até 1847,a classe operária,o subproletariado urbano de Paris(sans-culotes)entendeu que não poderia fazer,como fizera,aliança com a burguesia revolucionária,porque,no final,esta última sempre levava vantagem e passava por cima dos operários.
Foi assim que se gestou o conceito,que se cristalizou na figura do revolucionário francês Auguste Blanqui.
O editor das obras de juventude de Marx,David Riazanov,que se tornou curador das obras do marxismo na antiga URSS,no Instituto Marx-Engels-Lênin(nomenclatura atual),escreveu um texto em que contestava a comparação entre Blanqui e Marx,mas a sua distinção não invalida a origem do termo de Marx,”ditadura do proletariado”em Blanqui.
O que Riazanov diz é muito parecido com a discussão do século XX sobre a luta de massas e o foquismo da revolução cubana(Che Guevara):Marx não defendia uma luta direta para tomada do poder do estado,mas a luta de massas.Contudo a aceitação da ditadura é nos mesmos moldes propostos por Blanqui.E a ideia é de Blanqui.
Ao falar em ditadura do proletariado Marx devia ter reconhecido a origem e a declarado.Isso é importante porque no contexo da vida intelectual de Marx há um aspecto digno de nota,para identificar os problemas fundamentais do marxismo:o cientificismo.No volume III de “ O capital”,Engels compara Marx a Lavoisier.Para Engels Marx representava uma ruptura científica quanto ao passado do movimento social e comunista(que existia quase cem anos antes),assim como Lavoisier superara ( com a balança)a alquimia.
Estes dois exemplos são fruto do cientificismo,que vendeu esta ruptura para fins de luta contra a superstição e aquilo que não tinha método.Isto em parte é verdade também,mas o passado,o presente e o futuro de todo o processo de conhecimento se faz não necessariamente por rupturas,mas por tateio,por experimentação constante,nem sempre rigorosa e metódica.
Depois de Lavoisier,a ciência passou quase cem anos tentando compreender e provar a existência do átomo sem conseguir e num tateio cego que apresentava erros e acertos.
O conhecimento é assim.
Marx( e Engels)achava que a sua contribuição punha no lixo o seu passado,soterrado no conceito duvidoso de “ socialismo científico”.Mas o movimento social é plural,o passado conta no presente e a luta não se identifica obrigatoriamente com uma concepção cientifica e ,muito menos,com o marxismo.Marx devia ter citado Blanqui,por dever de honestidade e de valorização do movimento social.
Em outra das realizações de Marx eu dou de lambuja uma “ novidade”,cuja descoberta eu reinvindico como minha e exijo reconhecimento.
Riazanov ,num outro livro,composto de preleções sobre a vida intelectual de Marx e Engels,mostra que a famosa frase “ Operários de todos os países uni-vos” não era dele.
O episódios de 1847 e 1848 são contados por Riazanov:havia uma crise cada vez maior entre Weitling,chefe da liga comunista dos justos(a Liga dos Alfaiates[Weitling era alfaiate]).Esta crise girava em torno da concepção da luta de classes,tema muito comum naquela época.Weitling e a Liga dos Justos não aceitaram as visões Marx de que os interesses dos trabalhadores não se coadunavam com os da burguesia e que esta devia ser suprimida por uma revolução.Numa última reunião tumultuada muitos saíram da organização por causa de Marx,que ,ele também ,deixou o movimento.
Apesar de cético quanto às possibilidades de seu pensamento ser aceito em outras organizações comunistas ,Marx e Engels receberam uma proposta de uma outra Liga para fazer uma profissão de fé comunista a lançar na Revolução esperada.Engels mudou esta idéia para um manifesto e convidou Marx a participar das reuniões deste grupo.Na primeira nenhum dos dois participou,mas na segunda,Marx conseguiu,mais ou menos ,e contrariando o seu ceticismo,convencer os militantes a comungar de suas visões e aí,com a ajuda de sua Jenny e de Engels escreveu o Manifesto Comunista.
Ocorre ,no entanto,que Riazanov prova que Marx viu a frase final de seu Manifesto em revistas editadas pela Liga dos comunistas,uma edição única,de seis ou sete exemplares e colocou em seu texto.Riazanov tinha estas revistas,duas delas.
AQUI NO BRASIL EU É QUEM TRAGO ESTA REVELAÇÃO,QUE NÃO É CONHECIDA POR NINGUÉM E REINVINDICO O RECONHECIMENTO DESTE TRABALHO.
Muitos vão dizer que isto não tem muita importância,mas eu objeto que não raro a verdade ,por menor que seja,oferece uma compreensão mais exata do mundo e da sociedade.
Esta frase mostra que o socialismo é obra de coletividades,não de uma pessoa só.Em outras ocasiões outras frases atribuídas a Marx descortinam melhor a vida:Frei Betto afirmou numa entrevista que a frase “ A religião é o ópio do povo”,não é de Marx,mas de Kant.Ainda não encontrei esta prova,continuo procurando,mas se for fato ,prova que a crítica iluminista da religião não proveio só de Marx mas do iluminismo alemão,que influenciou Kant.
Muita gente em certas rádios,sem conhecimento,só falam no iluminismo francês,extremamente anti-católico,mas o iluminismo alemão é tão importante quanto e se imbrica com o cristianismo e mostra que o comunismo vem do cristianismo,pertence à tradição judaico-cistã de Bolsonaro.Marx foi tocado pelo iluminsmo alemão e este é em grande parte comunista.Lessing era comunista.
Se consultores da radio tupi se referirem a esta minha descoberta espero ser citado,pelo menos,em nome da minha pesquisa,que não precisa de canudo para ser válida.

domingo, 12 de maio de 2019

A partir de kruschev

Aqueles que leram o meu artigo sobre Kruschev e o debate da cozinha,leiam de novo,porque vão entender melhor o que vou dizer aqui.
O que significou Kruschev ,em última instância,foi a derrota do projeto bolchevique.A URSS não tinha nada a oferecer aos seus cidadãos após a morte de Stalin.Faltava,como sempre,comida,itens básicos de vida,tudo dentro do projeto stalinista de garantir a URSS enquanto a revolução mundial não vinha.
O degelo ,no entanto,veio acompanhado da constatação de que o povo soviético não aguentaria mais a situação de repressão aliada à escassez.As decisões fundamentais de Kruschev foram feitas com a corda no pescoço.Kruschev liberalizou o regime ,em termos,e lançou a “ coexistência pacifica”,pela quê cada partido comunista ,no ocidente, usaria os meios da democracia para chegar ao poder,sem interferência da URSS.
A ideia de que se poderia chegar ao socialismo através da democracia,se deu por causa deste acuamento,derivado do vicio de origem que era( e é)fazer a revolução comunista num país atrasado.
Aqueles que lêem os meus artigos sabem que ,para mim ,esta experiência do socialismo real está definitivamente acabada.Eu faço perguntas do tipo: haveria possibilidade de salvar o sistema no governo Kruschev ou no de Gorbachev,não para salvar o movimento comunista e o socialismo real,mas para salvar a ideia de uma utopia?
A minha incorporação da geopolitica ao problema da Utopia,se deu exatamente no âmbito das minhas reflexões sobre o governo Kruschev.A questão do socialismo na URSS não é senão o do papel geopolitico da Rússia e do hemisfério norte na mudança desejada no resto do planeta.
Se houvesse um Partido Comunista forte e enraizado nos Estados Unidos,em 1929,a História do mundo e do século XX seria outra,mas não necessariamente, e isto é bom,no sentido de uma confrontação como a que vimos na Guerra-Fria.A URSS não ficaria isolada na Europa ,provavelmente, e o socialismo,mais democrático,se espalharia pelo continente inteiro.Quer dizer, o totalitarismo da URSS ,causado por este isolamento,não ocorreria.
A abertura de Kruschev imposta a ele pelos fatos mostra que o socialismo tinha fracassado lá e que o reatamento das relações comerciais com o” grande inimigo” marcava o reconhecimento deste fracasso.A “ coexistência pacifica” era um termo de compromisso para esperar a vitória do comunismo no ocidente,mas expressava o fracasso.Se a revolução não viesse, e não veio, a tendência inevitável era o colapso do sistema que se instalaria,inclusive por causa do comércio com os EUA,porque a população russa ficaria(como ficou) mais e mais interessada em consumir,destruindo a conformação criada por Stalin,na década de 30,com os planos quiquenais.
Se lembrarmos direitinho Stalin garantiu a permanência econômica(que é o que podia mantê-la)do país,privilegiando as grandes obras,a produção em grande escala, em detrimento do consumo.O contato com os EUA diluiu progressivamente este modelo.E levou de roldão o socialismo.
As questões que giram em torno de Kruschev não se resumem nele,mas no problema geral geopolitico da mudança global,que não existe se não começar ou pelo menos se fixar lá,no hemisfério norte.
Eu sou ,ainda,terceiro-mundista.Não vou tratar agora deste assunto,mas devo dizer que ainda que uma revolução do terceiro mundista venha a ocorrer,sem adesão do primeiro mundo não se completa,no minimo.
Na minha opinião,a partir destas reflexões e de Kruschev,se quisermos apressar um pouco a utopia temos que considerar este rerferencial geopolitico,subjacente ao movimento comunista.E se entendemos bem o significado do comércio EUA/URSS,a inclusão do primeiro país na conexão entre geopolitica e utopia evitará o surgimento do imenso poder autoritário stalinista da URSS,mas ,eventualmente,ajudará na versão liberal do último Kruschev(1964),que pretendia um regime multipartidário ou um regime deste jaez ,humano,como o de Dubcek,na Techoeslováquia.O crescimento do socialismo nos eua anuncia uma grande possibilidade.

sexta-feira, 29 de março de 2019

Edmund Wilson e Marx



 
Petição de Principio

Este artigo inicia uma série muito importante para mim:como não tenho tempo para fichas ,citações e como ,fazendo artigos, eu me referencio fundamentalmente,como já expliquei,às categorias e à empiria,esta série me cria a oportunidade de mostrar o que eu trago de novo e o que já foi dito,pela análise da contribuição de certos autores.O primeiro é Edmund Wilson.
Edmund Wilson é um crítico de esquerda estadunidense,muito cáustico com o marxismo.Publicou um livro famoso “ Rumo à Estação Finlândia”,aludindo ao ato de Lênin de ir até à Estação Finlândia,como representativo da transformaçao do intelectual em politico prático.O nexo teoria-prática é representado por este momento fundante da Revolução Russa.
O capitulo mais importante para mim é intitulado “ O Mito da dialética”,o qual,escrito há muitos anos se refere a conceitos e idéias que eu estou expondo aqui,sobre a inexistência real da dialética.
Para mostrar a minha integridade faço este artigo para revelar como esta questão,tão desconhecida por nossos militantes diletantes,já é antiquíssima.
No inicio do capitulo ele diz:
“A “dialética” a que se referiam Marx e Engels não era o método argumentativo de Sócrates, e sim o princípio da mudança proposto por Hegel.”
Entendam bem este parágrafo elucidativo:
“O mundo está sempre mudando, diz Hegel; porém há nessas transformações um elemento de uniformidade: o fato de que cada processo de
mudança atravessa necessariamente um ciclo de três fases.
A primeira delas, que Hegel denomina tese, é um processo de afirmação e
unificação; a segunda, a antítese, é um processo de dissociação e negação da
tese; a terceira é uma nova unificação, que concilia a antítese com a tese e é
denominada síntese. Estes ciclos não são simples recorrências, que deixem o
mundo tal com o era antes: a síntese é sem pre um avanço em re lação, à tese, pois
ela combina, numa unificação mais “elevada”, o que há de melhor na tese e na
antítese. Assim, para Hegel, a unificação representada pelo início da República
Romana constituiu uma tese. Essa unificação inicial fora realizada por grandes
patriotas como os Cipião; porém com o passar do tempo o patriota republicano
assume um caráter diverso: a “individualidade colossal” da era de César e
Pompeu, uma individualidade que tende a perturbar o Estado à medida que a
ordem republicana começa a se deteriorar sob a influência da prosperidade
romana — esta é a antítese que se dissocia da tese. Porém por fim Júlio César
derrota seus rivais, as outras individualidades colossais, e impõe à civilização
romana uma nova ordem, autocrática, uma síntese, que promove unificação maior: o Império Roma no.”


Uma forma mais elevada aparece desta relação triádica,que Edmund Wilson localiza
na Trindade Cristã,que,por sua vez ,deriva do triângulo egipcio antigo,que expressava o nascimento e a reprodução da vida(Pai,Mãe e Filho).
E prossegue Wilson:
Marx e Engels adotaram esse princípio, e projetaram sua atuação no futuro,
coisa que Hegel não havia feito.”
Realmente Hegel não projetou um futuro utópico,mas atribuiu(oportunisticamente?)aos alemães(através dele)a compreensão final do processo real do movimento.Das leis do movimento do Ser.Do mundo.Os alemães tinham chegado ao máximo de pensamento possível(tal ideia agradava muito a Hitler).
Mas Marx e Engels construiram uma utopia a sair da sociedade burguesa,cheia de contradições só resolúveis por uma sociedade superior:comunista.
Embora ambos tenham achado que virando Hegel de cabeça para cima,colocando-o com os pés no chão,a diferença do proposto materialismo dialético para a dialética hegeliana não é tão grande ,no frigir dos ovos,porque a oposição Idéia/mundo real é falsa de todo modo e aqui eu digo que em outros artigos e livros já o provei.
Inicialmente o que Hegel denomina Idéia ou Espirito Absoluto não é propriamente uma ideia como a que o sujeito forma na mente.Há uma discussão imensa se ,de outro lado este conceito se refere a Deus.Esta discussão envolveu Luckács,na sua “Ontologia do Ser Social”,que separou a ontologia de Hegel da de Spinoza,que falava num Deus panteístico.
Este “ trecho” ou “ região” do pensamento hegeliano é muito obscuro.Idéia aqui é mais afeita ao pensamento de Aristóteles,que indica uma finalidade no mundo,um sentido prescrutável,com leis rígidas e definidas.
E o espirito Absoluto ,que “ se esquece do mundo”,só é apreensível pelo espirito subjetivo.O Espirito Absoluto é uma entidade um tanto quanto misteriosa,mistica mesmo.
Quem o prova é Karl Popper ,em seu “ A Sociedade Aberta e seus inimigos”,sobre os quais falarei proximamente,num outro artigo.
Da mesma forma há uma confusão de Edmund Wilson,comum no marxismo do século XX:a tríade dialética é uma siimplificação de Engels que não se encontra em Hegel,em lugar nenhum.O que há em Hegel é o princípio da Aufhebung ,palavra não traduzível em português que designa “ assimilação/superação” e que é o princípio do movimento.
O Espirito Absoluto é como um princípio,um princípio lógico do Ser,da Physis.Não há como afirmar peremptoriamente que ele seja o Deus de Hegel,assim como o “ pimeiro motor” de Aristóteles seja o Deus deste último.A Igreja Católica,no afã de assimilar o pensamento destes autores, é que atribuiu a estes conceitos um caráter divino.Mas não é assim não.
Voltemos ao nosso tema:Marx percebeu parcialmente esta verdade quando diz no “Capital”:
Para Hegel, o processo do pensamento que, com o nome de Ideia, ele chega a transformar-se em sujeito independente, é o demiurgo do
mundo real, enquanto o mundo real é apenas a sua aparência externa. Para mim,
pelo contrário, o ideal é apenas o material após ser transposto e traduzido dentro
da cabeça do homem”.
O problema é a demiurgia deste Espirito Absoluto,mas as observações anteriores são válidas.
Mas os dois afirmam também de forma menos esclarecida:
Marx e Engels haviam declarado que todas as ideias
eram humanas, e que toda ideia estava interligada a alguma situação social
específica, que, por sua vez, fora produzida pelas relações entre o homem e
condições materiais específicas.”
E Edmund Wilson pergunta,junto comigo:
“ Mas o que isto significa exatamente? “,quer dizer o segundo parágrafo?
É aqui o nó górdio que muita gente até hoje não entendeu:tudo o que o ser humano produz em termos de ideias é parte de relações sociais e econômicas e que o sentido próprio das ideias ficava então definitivamente explicado por estas relações e condições materiais de existência.
Engels,após a morte de Marx,procurou dirimir esta visão simplista dizndo que a economia só influenciava em última instância estas ideias ou as criava.
Mas então”,pergunta Wilson(e eu) “em que sentido era verdade que a economia determinava as
relações sociais e que as ideias se derivavam delas? Se as ideias não eram
“efeitos passivos”, então qual a natureza e âmbito de sua atuação? De que modo
atuariam sobre as condições econômicas? Como poderiam as próprias teorias de
Marx e Engels ajudar a produzir um a revolução proletária?”
E o critico responde:
Na verdade, Marx e Engels jamais desenvolveram detalhadamente seu ponto
de vista. O que nele há de importante e estimulante é a ideia de que o espírito
humano virá a dominar sua natureza animal através da razão; porém Marx e
Engels acabaram levando muita gente a achar que o que eles pensavam era
justamente o contrário: que a humanidade era inevitavelmente vítima de seus
próprios apetites.”
Aqui eu acrescento duas questões,uma já batida e outra que eu ressaltei de forma radical:respectivamente,a ideia de uma inevitabilidade lógica do socialismo e do comunismo e o fato de que nem Marx ,nem Engels conheciam bem a filosofia.
Wilson cita uma passagem da vida de Engels:
(...)Engels tentou apresentar uma visão geral da dialética; porém ele já
havia confessado, quando jovem, no tempo em que estava estudando filosofia
com a maior dedicação, que não tinha muita aptidão natural para essa disciplina;
assim, só pôde apresentar um esboço do sistema .”
Na verdade nenhum dos dois tinha conhecimento profissional da disciplina.
Wilson,sobre Engels no final da vida :
Já nas cartas de Engels escritas na última década do
século, uma época em que pessoas interessadas no marxismo estavam
começando a fazer perguntas fundamentais, vemos um ancião tentando com a
maior seriedade expor sua visão da natureza das coisas, e a impressão que têm os
dois é totalmente diversa. Escreve Engels: “Marx e eu somos em parte responsáveis
pelo fato de que, de vez em quando, nossos discípulos dão maior peso ao fator
econômico do que deveriam . Fomos obrigados a enfatizar seu caráter central em
oposição a nossos adversários, que o negavam, e nem sempre havia tempo,
espaço e oportunidade para fazer justiça aos outros fatores envolvidos nas
interações recíprocas do processo histórico”.
“(...)imagem pela qual, segundo o próprio Engels, ele e Marx são em parte responsáveis — é uma árvore cujas raízes são os meios de
produção, cujo tronco são as relações sociais, cujos galhos — a “superestrutura”
— são o direito, a política, a filosofia, a religião e a arte — sendo que a
verdadeira natureza da relação entre esses galhos e o tronco e as raízes é oculta
por folhas “ideológicas”.
E eu concordo com Wilson que não era isto que Marx e Engels queriam dizer:
Sua concepção é bem mais complexa.Cada um destes departamentos mais elevados da superestrutura — direito, política, filosofia etc. — está sempre
lutando para libertar-se das limitações que lhe são impostas pelo interesse
econômico e desenvolver um grupo de profissionais que sejam
independentes
das tendenciosidades de classe
(grifo meu), e cujo trabalho tenha para com as raízes
econômicas relações extremamente indiretas e obscuras. Esses grupos podem
atuar diretamente um sobre o outro, e até mesmo sobre a base socio econômica.”

Se repararem no grifo que eu fiz acima,veremos que aqui está o fulcro das minhas críticas e da critica em geral ao problema da autonomia das ideias em Marx e Engels.
De um lado se os especialistas lutam para superar as limitações de classe ,estão diante de um problema:na sociedade atual ou na futura,comunista?Certamente na scoeidade atual e neste caso a superação do problema de classe já é algo diferente da sociedade capitalista,que pode assim ser controlada ou modificada ,de dentro(estou dizendo).Esta assertiva nenhum militante aceita porque ao final das contas contém uma legitimação do capitalismo.Há que admiti-lo se é assim.
De outro lado se de dentro um especialista cria algo novo,não ideológico,no sentido de consciência falsa(que era o de Marx),ele questiona a visão da luta de classes como motor das transformações históricas,contida no Manifesto Comunista,porque esta construção não favorece esta ou aquela classe mas as relaciona,como ensina a ciência social ,a sociologia,que nem Marx e nem Engels conheciam.
Eu já falei sobre isto em outro artigo,mas estas citações só o confirmam.
Mas há ainda um terceiro problema que reúne a autonomia das ideias e a ideologia:presos ao hegelianismo Marx e Engels não realizaram o que era muito possível de fazer diante destas suas afirmações,de que esta produção dos especialistas das diversas áreas têm autonomia e que da consciência falsa surge uma consciência verdadeira,no sentido que Gramsci construiu depois.
Como eu disse no meu artigo:o desconhecimento de Kant,por seu não aprofundamento, não os permitiu abandonar Hegel e entrar muito antes no século XX.Ainda que uma concepção rigorosa da autonomia das idéias(e do Sujeito) só fosse possível com as contribuições posteriores de outro grande judeu,Freud,havia chance sim de um avanço por parte dos dois.
Vamos ver se dois exemplos o provam:
Numa carta Engels:
Diz ele que as leis referentes à herança
evidentemente têm uma base econômica, porque devem corresponder a diversas
etapas do desenvolvimento da família; porém seria muito difícil provar que as
liberdades de disposições testamentárias existentes na Inglaterra e as restrições legais da mesma natureza na França poderão ser explicadas somente por
causas econômicas.”
E existem outros exemplos:no caso do “ Dezoito Brumário”,quando Marx reconhece,por intermédio de uma frase de Odilon Barrot “ la legalité nos tue”(“ A legalidade nos mata”), o caráter ativo do direito,como produção cultural(quiçá revolucionário);quando Engels se refere ,no âmbito da Comuna de Paris em 1871,” que a religião é uma questão de foro íntimo” ,não interferindo pois no processo revolucionário(coisa que muita gente hoje precisava entender...).
Wilson cita uma questão do “ Prefácio de 1857”,que foi desenvolvido por Luckács nos “ Ensaios sobre Literatura”:não há relação entre forças produtivas avançadas e arte de qualidade.Vide a Grécia antiga,atrasada,agrária,mas que produziu,entre outros,Homero(aqui no Brasil quem desenvolve isto é Tomzé).
Quais são pois as leis gerais destas relações consciência e condições materias de existência?Há indicios de que Marx procurou estas leis,mas depois abandonou na velhice:
Em geral, o
conceito de progresso não deve ser entendido no sentido abstrato usual.”
Mas poderia sim ter ido mais adiante.Se prendeu ao cientificismo e à lógica imanente(materialista)do mundo(mas as relações sociais são transcendentes,não imanentes).
No entanto,nós hoje,de posse destes conhecimentos,podemos perguntar se mantendo a verdade das “ condições materiais”,podemos ir além com o marxismo,tornando-o profissional.
Assunto para outro artigo.
Bibliografia:Wilson,Edmund-”Rumo à Estação Finlândia”-Companhia de Bolso,1986-Rio de Janeiro.


sábado, 23 de março de 2019

Achille Ochetto e o Imperador Hiroito IV


Aqueles que não leram ainda os artigos anteriores sobre o mesmo tema,leiam,para poder entender o que vou escrever aqui mais abaixo.
Leram?Pois bem o que quero acrescentar agora é uma análise desta atitude dos militares japoneses contra os trabalhadores de seu país,que vieram para o nosso país para ganhar a vida,diante de um Japão destroçado.
Há uma similitude entre os militares japoneses que fizeram esta porcaria e os comunistas que não aceitam a derrota.
O japoneses que usam uniforme só têm como base e fundamento de sua atuação ideologias guerreiras e não o trabalho.
Por isso se sentiam incomodados pelos japoneses que seguiam na vida,acordando 5 horas da manhã para terminar a faina às 18 horas do dia seguinte.
O militar cria uma auto-imagem quase que psicopática,pois dependente dela própria,de seu narcisismo.Este é um dos fundamentos psicológicos da ergofobia,ou seja,do horror ao trabalho.
Quando se trabalha pode-se ter alegrias,mas também,tristezas,limites e sofrimentos,coisas que o narcisismo dos militares(e outros heróis)não admite.
Herói não perde.Sob o conceito de perseverança esconde-se a incapacidade infantil de aceitar a própria derrota.
Isto se aplica aos comunistas renitentes que não aceitam a queda do socialismo real.Não todos ,mas uma boa parte,que mistura a sua vida pessoal com a ideologia.Quando a ideologia acaba a razão de viver acaba e como isto é insuportável,é preferivel criar os motivos mais bizarros para a continuação.Mas ,na vida,como na História,é preciso sempre renovar.Existem equivalentes para a utopia.Eu falei aqui na Suécia(que muita gente aí na Globo News,Folha de São Paulo incorpora[sem me citar evidentemente]),como modelo de Utopia possível.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Marx( e Engels) é que nem Ptolomeu

Costuma-se culpar Engels por ter desvirtuado o pensamento de Marx,depois da morte deste,ao reunir sem muita lógica os dois volumes após o primeiro,de “ O Capital”.E não só em relação a este livro,mas tambem quanto ao Anti-Durinhg,o qual resume a concepção de ciência dos dois amigos autores.
Este último texto foi feito por Engels e apresentado a Marx,que com tudo concordou.
Contudo,no que tange ao Capital,a situação é diferente.Marx só completou em vida o primeiro volume ,dividido em dois tomos.Os segundo e terceiro volumes foram compilados por Engels,seu efetivo testamenteiro.E o quarto,sobre as teorias da mais-valia,por Kautsky,já que Engels havia morrido.
Este contexto todo impôs uma série de consequencias futuras graves até certo ponto,pois Engels foi acusado de desvirtuar Marx.
Esta discussão é muito extensa e eu a colocarei em outros artigos.Mas ela serve para discutir a relação entre estes dois pensadores e a interpretação que caiu sobre eles por parte dos seus seguidores.
Tanto no caso do Anti-Durinhg como no do Capital o problema central é o da concepção de ciência de ambos,aparentemente divergente.Engels teria enfatizado,contra Marx,o papel da ciência,em detrimento da História.Os marxistas se dividiram teoricamente entre os historicistas e os “ estruturalistas”:no primeiro os gramscianos e no segundo Althusser e Poulantzas.
Um capítulo famoso de “ Ler o Capital”,intitula-se “ O marxismo não é um historicismo”.
O modo-de-produção capitalista indica a justeza deste título,mas,no fundo não é possível separar uma estrutura de seus condicionantes histórico-temporais.
O tempo e o tempo histórico se fazem de determinados modos.Marx estuda o modo de ser do capitalismo,então estuda um modo de manifestação da História.O que é um modo,uma estrutura?Uma organização formal mais durável no tempo.Como o Ser e o devir,o Ser é o modo pelo qual o que existe se manifesta,segundo essências,conteúdos,substâncias e assim por diante.
Mas como disse Jean Wahl do Ser,se pode dizer o mesmo do modo e do tempo:o modo é extático ,é durável,mas não intocado pelo tempo.
Pertence ao cientificismo a convicção de que a estrutura,o modo de organização do real ,não se imbrica com o tempo histórico.São apenas durabilidades distintas,marcadas por mediações especificas.
A principal acusação a Engels é de que pelo uso cientificista da dialética(dialética objetiva)ele separou o amigo da História,mas isso,como vimos é impossível.
Contudo ,em Marx e Engels a concepção objetiva da dialética(conjuminada no Anti-Durinhg)pôs este problema na medida em que cria a ilusão de que o movimento dialético real altera o tempo histórico de maneira constante e definitiva.O tempo seria inelutavelmente dialético.
Muito embora Marx tenha se distinguido de Quesnay,em “ Salário,Preço e Lucro”,não aceitando o caráter fechado do sistema capitalista(conforme o “ Tableau Economique” deste fisiocrata),voltou ao erro pela aplicação da dialética.
Toda a questão da transformação dos preços de custo ,preços de produção em preços de venda,matéria do terceiro volume ,é distorcida por esta aplicação.
Engels não modificou nada em seu favor,ao organizar estes volumes,apenas deu seguimento a este erro.Do ponto vista editorial manteve-se o mais próximo de Marx,o que é o certo obviamente,mas não é culpa dele os problemas da dialética nos livros finais de O Capital,é culpa da dialética.Da dialética deles.
Neste sentido é que faz sentido o titulo deste artigo:como Ptolomeu formulou a teoria geocêntrica,por não ter elementos que lhe mostrassem a verdade,Marx e Engels foram induzidos a erros por entenderem a veracidade objetiva da dialética o que a ciência da natureza não confirma e não baseia.