quarta-feira, 29 de abril de 2015

Marx e Max Weber



Os  críticos,estudantes  e estudiosos  em  geral do marxismo sempre  compreenderam  mal  Max  Weber.Eles  afastavam  Weber  da  sociologia,inscrevendo-o  no  erro  de  inverter  as coisas(segundo critérios  marxistas,materialistas)na  sociedade,tomando  as  idéias  pelo Ser  Social,como a compreensão errada de Lênin(e Marx e  Engels)afirmou,como se  houvesse  contradição entre  o  Ser  social e  as  idéias.
Mas  o que  Weber afirmou  na  “Ética  Protestante”,o  livro  que gera  esta  interpretação, é que  para  haver  uma  mudança  social,política e  cultural  é preciso  haver  um  grupo social  afeito e  atinente  às  tarefas  que  uma  determinada  época  histórica exige.
Relembrando a polêmica,os  marxistas  diziam  que  ,para Webe,r o que determinou a  mudança  da  Idade  Média  para  o capitalismo  foi  esta    ética”,mas  não  foi  isto que  Weber  afirmou  realmente.
Muito embora  Weber  desprezasse a  dicotomia  “ superestrutura/infra-estrutura”  do marxismo , não era estranho  a  ele  que  os  movimentos  sociais  de  classe  estavam  associados(troca  simbólica)a  idéias  que  eram  geradas  por  eles ,mas  também influenciados  por  elas.
Não pensava  em  termos dialéticos,mas  compreendia que estas  coisas estavam  juntas.Assim  sendo ,para  que  ,politicamente,pudesse  haver um  movimento em  direção  ao  estabelecimento definitivo do capitalismo, era  preciso  um grupo  social  crescente capaz  de  realizar  as  tarefas  próprias  deste escopo,que eram  a capacidade produtiva  do  ethos do  trabalho,e  a capacidade  de  entesouramento,a  popular  poupança,que ainda  hoje  e mais ainda  tem  importância.
Estes setores sociais  novos   viajaram pela  Europa  com  esta poupança ,comprando governos  que  lhes  deram guarida,como  A  Suíça  de  Calvino  e  Zwinglio ,os  países  nórdicos  ,como os pietistas  e  assim por diante.Foram  perseguidos  por crenças  religiosas,mas  conseguiram  s e fixar  no  norte  da  Europa,garantindo o  crescimento  da liga  hanseática,num sentido de  quebrar  as  suas  barreiras(tributárias) e  com  os Estados  nacionais formados ,  desenvolver  este  sistema econômico  que está aí.
Muito pouca gente  sabe  que  o esforço  de  Felipe  II,com a  invencível  armada ,era  para  recuperar,através  da  Inglaterra,o  poder  das  nações  ibéricas  e católicas  do  Mediterrâneo,que estavam  sendo  progressivamente  superadas  economicamente pela  Europa  Setentrional.
A  derrota  de Felipe II  marcou  o fim  dos  Estados  mercantilistas,hiper-metalistas,calcados no predomínio  do  Estado  e  o  crescimento  dos  Estados burgueses  modernos,baseados  no  mercado  capitalista,como  mostra  Caio  Prado Júnior(um  marxista).
A  poupança é  um  dos aspectos  daquilo que  Marx  mostra no  “Capital”,a “Acumulação  Primitiva”,que  assegura  a  hegemonia  do capitalismo.
Portanto,se  olharmos bem e deixarmos  de lado o marxismo  vulgar,os dois  se  completam.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

O Estado como transcendência



Desde  o inicio  da humanidade,desde  a  tão falada  Jericó,que  nenhum  homem  pode  mandar  no  outro homem  sem  um  motivo,sem  algo  que  os  convença.Na  civilização  o convencimento é  para  criar  uma  relação  entre  dominador e  dominado,mas  na  comunidade  primitiva  a  relação  era,em  grande  parte,igualitária.Em  ambos os  casos  este elemento  funciona  como um  transcendente  entre  duas subjetividades,que  operam  a  troca  simbólica,sociologicamente falando.E  axiologicamente,antes  como agora,estas  portam  valores  transcendentes,pois  o transcendente é  valor.
Um  pouco  deste igualitarismo  permanece na  civilização,mas  nesta o poder  militar  ,certamente,já  joga  um  papel  decisivo.Contudo o  elemento  relacionador  e  agora justificador  desta    hierarquia”é  algo que    existia na  comunidade  primitiva,mas  que  neste momento  adquire  um outro  significado,diríamos  hoje,” ideológico”(como consciência  falsa[justificadora]):as  normas  religiosas,míticas.Estas  são     valores”,interpretados  segundo novos  interesses  ,a  buscar  legitimação/justificação(consciência falsa[ideologia{de novo}])
Ainda  que  ao  longo da  História  ocorram  fraturas  neste processo  ideológico de justificação,pelos  modos  variados  de sua interpretação,só  foi  possível manter  uma  certa  ordem  na  sociedade ( de classes)   a  partir  dele  e  de uma  certa  paz  garantida  pelas  condições materiais  de  existência.
Às vezes,no  entanto,as  condições  materiais  não mudam,mas  mudam  os  critérios  normativos  religiosos  de  justificação.
Foi o que  sucedeu  na época  da  Reforma,no  âmago  do  Renascimento.Mesmo  que por trás  dos  acontecimentos,  fatos  sócio -econômicos ajudassem,a  hipocrisia  do  Cristianismo  Católico  tirou-lhe  os  meios  ideológicos  de convencimento   de parte dos fiéis  para  projetos  de  manutenção  do  seu poder,como foram as indulgências.
Em  nossa  época  temos  a oportunidade  e  o  dever  de  fazer  algo semelhante,em  definitivo,separando  de  fato as  normas  da  religião  e  dos diversos  misticismos  e  ideologias  justificadoras  de  nosso  tempo.
É  o  processo  de laicização,tão decisivo  quanto o de    mundanização”  que  vem junto com  a “ globalização”.Neste  particular os  transcendentes  decisivos  não  são  as  normas  religiosas,que,como  no  passado,serviam  como   mediania  entre  senhor  e escravo,senhor  e  servo,operário e  burguês,mas  as normas  políticas e  jurídicas  que  permitem  incluir  a todos  num processo de transformação real   desta sociedade  inteiramente  ao  sabor das  criticas,mas sem  apresentar  soluções    efetivas.
Estas  “ normas laicas”  são  as  únicas  que  não estabelecem  barreiras  para  as  pessoas,pois  as  religiosas  partem sempre  de  divisões  e denominações  seguidas  pelos  mais diversos  grupos sociais ao longo  do  tempo.
Diferentemente dos  anarquistas (e  dos  marxistas)a  recusa pura e simples  do Estado  põe  este  homem  supostamente “  livre”,dissociado de  algo que é dele,que  nasce e  se  mantém  por  ele  e  com  ele.
Separar  o  homem  da  formalidade  é  como  separá-lo de  suas  idéias e  de  seu direito de expressão(liberdade).
No  passado  recente a    verdadeira liberdade”  era  tida  como  libertar  o    homem  do homem”(“ o mal é  a ´exploração  do  homem pelo homem´”[Lênin]).O  teatrólogo brasileiro  Jorge  Andrade  disse certa  vez “ Só  quando  o  homem  s e libertar do  homem  haverá  liberdade” e  até  os  liberais  chega(-ra)m a  concordar  com  isto.
A  verdade  ,no  entanto, é  que isto  fere o  fato que  revelamos  acima,  de  que  não    liberdade  na  vontade,como Kant  descobriu,mas  na  relação com a  norma,na  relação  com um  terceiro  elemento entre  ,pelo  menos ,dois homens(troca  simbólica).
Uma  vez que  a  mera consciência  do  dever de respeitar  o outro  não é  suficiente para  evitar  a  violência(nazismo=nação  “civilizada”),a  inexistência  de um terceiro elemento  ,transcendente ,axiológico,que  pode  vir em  socorro  do oprimido ou  ser  alegado por  ele,o  deixa  desamparado.
Desamparo é    ,para mim,a  palavra  definidora da  humanidade.Infelizmente a  crença  de uma  liberdade  sem Estado(e  como decorrência de  seu descarte)e  sem direito(norma)(idem)é  uma  ilusão  ,derivada  do  mito  rousseauísta  do    bom selvagem”  e  que  os  referidos massacres do  século XX   trataram de destruir.A  maior  consciência destes  valores  não impede,por  mínimo  que  seja,o desamparo  diante  da violência;  e sem  uma  instância  transcendente,normativa(pura[sem  ideologia ou  véus  místicos]),a  nêmesis  fica  sem  resposta.
O  Estado,como  garantidor  do  direito  que vem  em  socorro  do  oprimido,tem  também,esta  natureza  não-repressiva,mas  humana,geral,universal,passado(experiência  do passado  em  seu socorro ),tem  validade  transcendente,para  além  dos  que dominam  eventualmente  o seu  aparelho.

sábado, 25 de abril de 2015

Saberes e ilusões do anarquismo(e do marxismo)



Num  texto  importante  Engels  uma  vez  disse,  que  os  objetivos  dos  comunistas e  dos  anarquistas  eram  os  mesmos,acabar  com  o  Estado.
Falemos a  sério:desde  Jericó  que o  Estado    existe  enquanto  existe  o  trabalhador  que,  com  o  seu  suor , mantém a  sua estrutura   administrativa  em  pé.O  caráter  repressivo  do  Estado  é,por  isso,ilegítimo,desde  as  cidades  bíblicas.
Esta  história  de  que  foi  Rousseau  quem  colocou  as  coisas nos  devidos  lugares,ou  seja,o  povo  no  centro do  poder,é  uma  meia-verdade,porque  ele  reconheceu  aquilo  que é  fato,desde  priscas  eras.Ele  “apenas”  laicizou  uma  idéia  que está  contida  nas concepções  de  Tomás  de   Aquino,segundo  a  qual,como  sabemos,o  príncipe  cristão  deve  ser  apeado do  poder  se  não  governar a  cidade  conforme  os princípios  da  religião.
Na  verdade  Rousseau  refundamenta este  conceito , dizendo  que  os valores religiosos  não   são  os decisivos  para a  relação de poder,mas  aqueles  que  já estavam  na  referida  Jericó.Quer  dizer , formalmente  o  Estado  é  uma  representação  dos    de baixo”,hoje  gramscianamente  chamados  de  “ subalternos”.Embora  a mediação  do  trabalho    viesse  com  Marx(um seguidor  de  Rousseau,até  certo ponto),ela  estava,in  limine,na  sua  concepção  da  “ soberania popular”.
Com base  nestes pródromos o  anarquismo  radicalizou,afirmando que  ele impedia  a afirmação da  essência  verdadeira do  homem,mas  esta  barreira se  refere  ao  seu  caráter  repressivo.
A  oposição  alienante  entre  o  sujeito,o  cidadão  e  o  estado  depende  do  modo  como  ela  se  dá.É lógico,e  isto também  está  em Rousseau,que  o  homem  não  pode  ser tomado,como  ser  universal  que é  ,pela  parte,o  Estado.O  Estado  não o    define”.O  Estado  é  incapaz  de  absorver  esta  universalidade.Mas  nem  é  o  caso.O  Estado  não tem  que  abarcar a  todos,pois  os  representa,formalmente,e  devolve(ou  deveria)aquilo  que  todos  deram a  ele.Se  não  faz  é porque  foi sempre  uma instância  repressiva  e esta  derivativa  da  dominação de uma  classe  ou setor  da  sociedade  que    toma”  do  todo,aquilo  que  é  dele,sob  as  mais  diversas  justificativas  ideológicas(consciência  falsa,véu  místico).
Não  é  medida  da  efetiva  libertação  humana  a  extinção  do  Estado,pois  em  vista  disto não  é  na  relação  com  o  Estado  que  o  homem se  define,mas  no  modo  como  ele  a  vê(sendo  isto    uma  forma  de alienação[quer  dizer  atribuir  ao  Estado condições  de defini-lo]).
O  homem  é  reprimido  pelo  Estado  ,mas  pode manipulá-lo a  seu  favor,mesmo  porque,não existe  sem  ele(o  estado em relação ao homem),como  dissemos.E  esta  atitude  positiva  é  legitima  e  autêntica,pela mesma  razão.
Os  anarquistas(e  os  marxistas)confundem o  Estado  com a  sua  mediação repressiva,mas a repressão é  de uma  classe  por  outra,não se  identificando  esta  repressão  com o Estado  todo e  a sociedade  toda.
Eu  penso  que  quando um criminoso cumpre  uma pena,ou  acaba de  cumpri-la  ,ele  deveria  ser  “ ressocializado” através  do  Estado,de  funções   estatais(servidor  público).Isto  tiraria  dele,aos  poucos,como  é a  condição de  ressocialização,o sentimento de  culpa em  relação  ao  cidadão  e  trabalhando e  se  recuperando,no  âmbito  do  Estado,que é  dele(pois mesmo na  prisão  continuaria  a trabalhar),ele  poderia  expiar  o  crime e  a  culpa  sem  medo de  arriscar a  sua  relação  com  os  outros.Provando  para si mesmo,antes  de voltar  ao convívio  social,ele  teria razões  e  condições  definitivas  de nunca  mais reincidir e  o  Estado  cumpriria,como  instância representativa,um  papel  libertador,contra  o  dogma  dos  anarquistas(e  marxistas).
O  grande  problema  de  todo  aquele  que  delinqüe  é que ele  se  sentirá sempre  “ manchado” e  se  for  ressocializado  pela  mão do outro,nunca  deixará  de  ter  este  ferimento  no  seu orgulho,este  dever.Se  se  superar  a  partir  do  Estado,este    complexo  de inferioridade”,o  maior  impeditivo de  sua    cura”,estará  afastado.