segunda-feira, 27 de abril de 2015

O Estado como transcendência



Desde  o inicio  da humanidade,desde  a  tão falada  Jericó,que  nenhum  homem  pode  mandar  no  outro homem  sem  um  motivo,sem  algo  que  os  convença.Na  civilização  o convencimento é  para  criar  uma  relação  entre  dominador e  dominado,mas  na  comunidade  primitiva  a  relação  era,em  grande  parte,igualitária.Em  ambos os  casos  este elemento  funciona  como um  transcendente  entre  duas subjetividades,que  operam  a  troca  simbólica,sociologicamente falando.E  axiologicamente,antes  como agora,estas  portam  valores  transcendentes,pois  o transcendente é  valor.
Um  pouco  deste igualitarismo  permanece na  civilização,mas  nesta o poder  militar  ,certamente,já  joga  um  papel  decisivo.Contudo o  elemento  relacionador  e  agora justificador  desta    hierarquia”é  algo que    existia na  comunidade  primitiva,mas  que  neste momento  adquire  um outro  significado,diríamos  hoje,” ideológico”(como consciência  falsa[justificadora]):as  normas  religiosas,míticas.Estas  são     valores”,interpretados  segundo novos  interesses  ,a  buscar  legitimação/justificação(consciência falsa[ideologia{de novo}])
Ainda  que  ao  longo da  História  ocorram  fraturas  neste processo  ideológico de justificação,pelos  modos  variados  de sua interpretação,só  foi  possível manter  uma  certa  ordem  na  sociedade ( de classes)   a  partir  dele  e  de uma  certa  paz  garantida  pelas  condições materiais  de  existência.
Às vezes,no  entanto,as  condições  materiais  não mudam,mas  mudam  os  critérios  normativos  religiosos  de  justificação.
Foi o que  sucedeu  na época  da  Reforma,no  âmago  do  Renascimento.Mesmo  que por trás  dos  acontecimentos,  fatos  sócio -econômicos ajudassem,a  hipocrisia  do  Cristianismo  Católico  tirou-lhe  os  meios  ideológicos  de convencimento   de parte dos fiéis  para  projetos  de  manutenção  do  seu poder,como foram as indulgências.
Em  nossa  época  temos  a oportunidade  e  o  dever  de  fazer  algo semelhante,em  definitivo,separando  de  fato as  normas  da  religião  e  dos diversos  misticismos  e  ideologias  justificadoras  de  nosso  tempo.
É  o  processo  de laicização,tão decisivo  quanto o de    mundanização”  que  vem junto com  a “ globalização”.Neste  particular os  transcendentes  decisivos  não  são  as  normas  religiosas,que,como  no  passado,serviam  como   mediania  entre  senhor  e escravo,senhor  e  servo,operário e  burguês,mas  as normas  políticas e  jurídicas  que  permitem  incluir  a todos  num processo de transformação real   desta sociedade  inteiramente  ao  sabor das  criticas,mas sem  apresentar  soluções    efetivas.
Estas  “ normas laicas”  são  as  únicas  que  não estabelecem  barreiras  para  as  pessoas,pois  as  religiosas  partem sempre  de  divisões  e denominações  seguidas  pelos  mais diversos  grupos sociais ao longo  do  tempo.
Diferentemente dos  anarquistas (e  dos  marxistas)a  recusa pura e simples  do Estado  põe  este  homem  supostamente “  livre”,dissociado de  algo que é dele,que  nasce e  se  mantém  por  ele  e  com  ele.
Separar  o  homem  da  formalidade  é  como  separá-lo de  suas  idéias e  de  seu direito de expressão(liberdade).
No  passado  recente a    verdadeira liberdade”  era  tida  como  libertar  o    homem  do homem”(“ o mal é  a ´exploração  do  homem pelo homem´”[Lênin]).O  teatrólogo brasileiro  Jorge  Andrade  disse certa  vez “ Só  quando  o  homem  s e libertar do  homem  haverá  liberdade” e  até  os  liberais  chega(-ra)m a  concordar  com  isto.
A  verdade  ,no  entanto, é  que isto  fere o  fato que  revelamos  acima,  de  que  não    liberdade  na  vontade,como Kant  descobriu,mas  na  relação com a  norma,na  relação  com um  terceiro  elemento entre  ,pelo  menos ,dois homens(troca  simbólica).
Uma  vez que  a  mera consciência  do  dever de respeitar  o outro  não é  suficiente para  evitar  a  violência(nazismo=nação  “civilizada”),a  inexistência  de um terceiro elemento  ,transcendente ,axiológico,que  pode  vir em  socorro  do oprimido ou  ser  alegado por  ele,o  deixa  desamparado.
Desamparo é    ,para mim,a  palavra  definidora da  humanidade.Infelizmente a  crença  de uma  liberdade  sem Estado(e  como decorrência de  seu descarte)e  sem direito(norma)(idem)é  uma  ilusão  ,derivada  do  mito  rousseauísta  do    bom selvagem”  e  que  os  referidos massacres do  século XX   trataram de destruir.A  maior  consciência destes  valores  não impede,por  mínimo  que  seja,o desamparo  diante  da violência;  e sem  uma  instância  transcendente,normativa(pura[sem  ideologia ou  véus  místicos]),a  nêmesis  fica  sem  resposta.
O  Estado,como  garantidor  do  direito  que vem  em  socorro  do  oprimido,tem  também,esta  natureza  não-repressiva,mas  humana,geral,universal,passado(experiência  do passado  em  seu socorro ),tem  validade  transcendente,para  além  dos  que dominam  eventualmente  o seu  aparelho.

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