sábado, 3 de março de 2018

François Furet,Lênin e Hitler



No seu livro “ O passado de uma ilusão”,a respeito do fim do comunismo, o pensador de direita francês François Furet comparou Lênin e Hitler,chamando o primeiro de “ pré-Hitler”.
Do ponto de vista sociológico a afirmação é escandalosamente errada.Não é porque os regimes de direita ou de esquerda  podem se igualar no totalitarismo(como quaisquer regimes[conceito de Hannah Arendt])que eles são iguais.
Ainda me lembro na época  da ditadura o jornalista Ib Teixeira comparando o fascismo de direita com o fascismo de esquerda(URSS),diante de Luis Carlos Prestes.
Um canal de televisão ,que eu não lembro qual ,teve a possibilidade  de entrevistar o líder comunista,em Paris,onde houve uma importante reunião do Comitê Central do PC brasileiro.A entrevista foi interrompida bruscamente porque os debates se acirraram depois destas afirmações do jornalista.
Eu a cito para mostrar como há  confusão de   conceitos,por parte das pessoas de direita ou de esquerda,que militam.É claro que qualquer idéia,qualquer tipo de governo pode se tornar totalitário,mas fascismo é outra coisa.
Leandro Konder já era doutor de fato quando publicou o seu livro “ Sobre o conceito de Fascismo”.Este livro visava a cumprir um papel no debate da esquerda diante da referida ditadura militar brasileira.Perguntava-se se ela era fascista ou não(eu já falei sobre isto em outro artigo).Se fosse fascista a luta armada se justificava,se não,não.
O PCB defendia a luta política ,negando o seu caráter fascista.Havia espaços de luta.Mas a esquerda radical entendia do modo contrário e partiu para enfrentar as forças armadas  com os seus bodoques.
Fascismo,em suas variações,se caracteriza por uma base social  pequeno burguesa e burguesa,contra os comunistas e os sindicatos.Embora houvesse repressão contra os sindicatos no Brasil,não se comparava  com o que havia nas ditaduras fascistas.Até a esquerda reconhece o apoio dos trabalhadores(contra as direções[que estavam presas])ao regime,especialmente no governo Médici .
Os espaços de política existiam realmente e a luta armada,fadada desde o inicio ao fracasso,só ajudou a ditadura a continuar.
Então a Revolução russa e o nacional socialismo alemão  não são iguais senão no processo de constituição do totalitarismo,mas suas bases sociais são diferentes e isto é importante para demonstrar que a classe operária(que Lênin em “ A doença Infantil do esquerdismo no comunismo” dizia não se transformar em santo [grifo do Lênin])também pode cometer erros e crimes.
A Revolução Russa tem uma natureza totalmente diferente do nacional socialismo e eu já expliquei o significado  deste último ,que não é revolução nenhuma.Mas ao se inscrever ao território nacional,a Revolução Russa deixou de ser progressista para ser uma restauração da política czarista,como Trotski analisou.
Tem muita gente aí que se vincula ao trotskismo na internet e que ficou com calafrios e arrepios ao ler o meu artigo anterior,mas se tivesse o  conhecimento dos textos do seu mentor,não ficaria.
Eu preciso escrever livros com os meus conceitos ou indicar que leiam o que escrevo para não entender mal o meu pensamento.
No entanto,num aspecto,é preciso ligar polìticamente o nacional-socialismo à URSS:o capitulo mais importante de Mein Kampf intitula-se “ O homem forte é mais forte quando está só”.Parece uma afirmação adolescente,que induz muita gente a lê-lo,mas contém uma concepção política de Hitler calcada no regime de partido único na URSS.
A justificativa para fazer este regime de partido único na Alemanha,não poderia usar o exemplo soviético,porque isto seria reconhecer indiretamente o mérito do adversário e dentro da ideologia imperialista de Hitler isto travaria a legitimidade de uma invasão.
Então em Mein Kampf Hitler usou um argumento original para justificar a destruição do “ outro”,dos “ inferiores”:a prova de coragem e de superioridade é a dominação definitiva do adversário.Os impérios ,como o Inglês,que Hitler tanto admirava,não sobreviviam porque deixavam vivos os dominados,que sempre(naturalmente)se rebelavam e venciam( naturalmente).Hitler nunca  permitiu que a mulher participasse da guerra(só no final),porque ela deveria(como seu modelo nacional Magda Goebbels)ser a parideira de novos alemães,que iriam povoar as terras conquistadas.Este era o conceito de “ guerra de aniquilação” de Hitler,a pura afirmação do direito absoluto de império.Costuma-se comparar acertadamente a figura de Hitler com Torquemada e principalmente Cortéz,porque ambos foram destruidores absolutos.O bispo Bartolomeu de Las Cases reprovou a Cortéz o ter destruído a cidade asteca de Tenochtitlán,porque seria obrigatório para a metrópole espanhola refazer tudo(despesa).Era melhor ,segundo ele,manter a cidade,pelo menos,para não ter esforços de edificação custosos.
Mas Cortéz usou o princípio do imperialismo português ,de terra arrasada,para manter o maior tempo possível o seu domínio.Hitler queria o mesmo na Europa.
Toda a pessoa democrática e ética não segue este “ destrutivismo”.Na democracia e na atitude construtiva há que se considerar o outro de razão,de sentimento,de cidadania.A democracia é um regime em que a população escolhe quem tem a melhor proposta para a sua vida.Isto implica  em aceitar um vencedor,na eleição,e um perdedor,que deve continuar a sua luta.
Na vida pessoal é difícil aceitar perder,mas na vida pública isto é essencial,como no esporte,em que a derrota não é definitiva.
Todo autoritário não admite estar errado ou perder,em hipótese nenhuma, e o cientificismo(ou ideologia científica)é usado para justificar este dogmatismo autoritário.
A pessoa ética e democrática ,no entanto,não constrói a sua vida na destruição do outro.
Quando Hitler propõe ,em seu livro,que é ético mostrar força e coragem eliminando o outro em definitivo,na verdade,está encobrindo a sua covardia,o seu dogmatismo totalitário.
Assim Hitler justifica o partido único na Alemanha,não alegando similitude com a URSS,mas a representação inelutável do Partido Nazista do povo alemão,do corpo (genético)do povo  alemão.
Eu aconselho a quem quer ter compreensão do mundo ler de tudo,principalmente aquele de que você discorda ou é contra você.Não tenho dúvida de que Israel estudou e estuda textos nazistas,até hoje.
O discurso lógico de destruição deve ser lido e entendido,para,no mínimo, antecipar as suas conseqüências.
Este é o caso de Hitler e da relação que eu estabeleci entre aspectos do totalitarismo alemão com o soviético.Uma ligação existe.Stálin acostumou-se a matar e destruir por covardia,por acreditar legítimo o seu direito absoluto de governo.O partido comunista era o partido do trabalhador,que para não ser explorado tinha o direito de eliminar quem a ele não se adaptasse.Há uma similitude aqui sim.Sinto muito.

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