Tudo é uma questão de método.O
método na ciência(e a própria ciência[como tudo na vida]),muda
com o tempo e com o tempo qualificado,que é a história.
Até muito recentemente estas
verdades não eram reconhecidas e pensava-se muito numa ciência ,num
saber ,definitivos.A noção do tempo não era compreendida em todas
as suas implicações.
A revolução francesa consagrou o
princípio dinâmico da sociedade moderna,que,livre da idade média,se
permite colocar novos fundamentos para si própria,à hora desejada.
Não é à toa que Beethoven
representa muito deste periodo novo,na medida em que ,como
criador,permite a criação de diversos códigos de criação para a
sua arte e para a dos outros,que o seguem(Roland Barthes).
Este debate entre tempo e novos
códigos e dogmatismo atinge também o marxismo,na sua relação com
a sociologia.
O meu primeiro contato com Weber
foi o pior possível,porque ele me apareceu distorcido pelo
dogmatismo stalinista que o considerava prócer de uma “ ciência
burguesa” ,se é que isto existe.Naturalmente a maturidade
esclarece muitas coisas,ajudada pelos fracassos do marxismo.
É uma exigência ,depois do fim
do comunismo,rever conceitos,após reconhecer,psicológica e
éticamente a derrota.
Sim ,porque não e´uma questão
técnica ou funcional a derrota,mas teórica,de fundamentos.Se o
socialismo real,de orientação comunista,fosse bom,não teria caído
tão fácil e analisando a sua trajetória fica clara a dependência
cada vez maior do socialismo real do capitalismo,que acabou por
passar por cima dele,inapelavelmente.
Não é à toa que os chineses
tiveram que reformular o seus critérios de competição com o
capitalismo,primeiro aderindo a ele em grande parte e segundo
evitando uma competição simétrica tradicional,isto é,pari
passu.Os chineses competem usando várias estratégias
inter-relacionadas e indiretas de competição,para evitar que uma
corrida acabe destruindo a China.
Mas estes são temas de outro
artigo.Por trás destas discussões que eu adiantei está o problema
metodológico que opõe Karl Marx a Max Weber.
Os comentadores de Karl Marx são
acordes em dizer que ele usa a Totalidade como meio metodológico de
atingir os seus objetivos científicos.A totalidade,como “síntese
de múltiplas determinações”,não é mais do que o método
dedutivo-racional de Aristóteles acrescido da dialética
hegeliana,”colocada sobre os seus pés “.
A “ síntese de múltiplas
determinações” não prescinde de uma premissa racional que dê
sentido a esta totalidade:a totalidade não é indistinta ,como a
dialética não é.Não tem sentido tomar dados do real e observar as
suas reciprocas determinações a fazer sentido por elas
próprias.Como seria o esquema do Capital,da produção de
mercadorias,se Marx não tivesse colocado a premissa?A premissa é a
mercadoria,o padrão mais geral do capitalismo.Mas este padrão é
típico da metodologia dedutivo-racional,aristotélica.Isso constitui
uma contradição com a ideia da dialética,mas isto é assunto para
outro artigo também.Não nos desviemos.
O fato é que Marx é um
Aristotélico,utilizando padrões gerais ou um padrão total,para
,deduzir as suas partes e manifestações,como fez com a mercadoria
no Capital.Depois ele aplica a dialética ou a usa pari passu.Marx
decompõe a mercadoria e analisa o seu processo de
produção,reprodução e circulação.
A sociologia vai se formando aos
poucos e Marx é um dos seus criadores quando inicia a sua explicação
da mais-valia,pelo “ tempo de trabalho socialmente necessário para
a produção de mercadorias”.A mais-valia não foi descoberta só
por Marx.Os economistas neo-ricardianos,como Eduard Thompson e Joseph
Bray a anteciparam.Ricardo não,mas estes seus discipulos revelaram
que o trabalho é que agrega valor às mercadorias,aos bens e
produtos.Esta afirmação ,no entanto,por si só,não explica o
capitalismo.O capitalismo é um sistema no tempo,atuando segundo
modos especificos de produção e é só assim que é explicável a
produção de mais valia:aquela que mantém o sistema funcionando.
A sociologia,no entanto,é
descritiva e compreensiva,porque ela percebe que o modelo de
padronização racional ,embora inelutável,não cobre a infinidade
de eventos,inclusive singulares,da sociedade.Como expliquei em outro
lugar,a burguesia,pressionada pelo movimento social ,resolveu
investigar as condições precárias em que viviam os
trabalhadores,no intuito de conter as suas reinvindicações.Neste
contexto é que surge a sociologia.
Diversas correntes vão delineando
esta “ ciência”,com os momentos decisivos de Comte e de
Durkheim,com o fato social.Mas a questão fundamental da sociologia é
a sua descritividade,a sua compreensibilidade,diferente dos padrões
racionais dedutivos de Aristóteles.Não é que a sociologia acabe
com Aristóteles,ma só limita,mostrando que as leis sociais são
tendenciais e não certas,absolutas,como pensava o estagirita e
pensam ,em muitos casos,a ciência e a filosofia.Sim porque a
sociologia não tem condições de substituir evidentemente a
ciência, a filosofia.
Trago esta questão por causa da
comparação proposta entre Max Weber e Marx.Marx ainda é
fundamentalmente um aristotélico enquanto que Weber propõe uma
metodologia sociológica isenta.
Como acabamos de falar uma coisa
são os padrões dedutivo-racionais,outra a descritividade,a
compreensão que esta descrição proporciona.
Porque considero que o método
sociológico é melhor do que o de Marx?Porque ele abarca a sociedade
em seus momentos singulares,enquanto que o método aristotélico
forma padrões essenciais ,deixando de lado o que é acessório.A
sociologia compreensiva inclui estes momentos acessórios.
Como se sabe, a formação de
padrões racionais e sua compreensão serviu de base a exclusões
sociais e politicas,em todo o ocidente:os povos e pessoas incapazes
de compreender esta “ razão”(dasein:esta razão aí)foram,de
algum modo,excluídos.A razão e a sua inacessibilidade foram usados
para os piores crimes.
Sempre me impressionou que Max
Weber usasse ,para suas análises,não categorias monumentais
próprias do aristotelismo.Aristóteles usa “Ontologia”,”Arethe”
e assim por diante ,mas Weber constrói explicações complexas com
expressões coloquiais ,de pessoas às vezes iletradas,como nos seus
estudos de religião.Ele chega ao cúmulo de reproduzir certas frases
recorrentes em determinados grupos e seitas para fundamentar
explicações.
No sociologia do futebol fica
assentado que é possível mudar certos termos,para inclusive,no
plano social,induzir mudanças.Ao invés de se referir a um clube “
pequeno”,inexoravelmente,pode se dizer “ clube de menor
investimento”,que pode se tornar depois,de “ maior”.
Por mais que o marxismo tenha a
intenção de ser popular e humano ,a sua matriz
aristotélico-hegeliana o induz a derrapar na excludência e nele,ab
ovo,estão as horriveis consequencias futuras decorrentes das
tentativas de provar a justeza da teoria.Em Marx está um pouquinho
sim(sem ele saber)de Stalin.
A caracterização do
campesinato,como “ cretino”,por parte de Marx(“ cretinismo do
campo”como se vê no “18 brumário”),o prova,porque foi isto
que justificou,entre outras coisas,a violência contra os
camponeses,na “ coletivização forçada”.Este tipo de pensamento
não era só de Marx,mas do cientificismo e do Iluminismo,mas depois
tratarei disto.O fato de cientificamente se considerar as relações
no campo como arcaicas,diante de um mundo melhor porque mais
produtivo,(não)justifica a violência,mas acaba justificando,diante
das “ necessidades politicas”.
De outro lado Weber mostra como o
reconhecimento ,por parte das famílias protestantes em torno de uma
mesa de almoço,agradecendo a comida proporcionada pelos
camponeses,em oração,por pequena (a contribuição[o trabalho]{e a
comida})que seja,marca um ponto acima dentro dos humanismos propostos
,o marxismo e a sociologia weberiana,a favor,claro ,desta última.
Por isto prefiro Weber a Marx.
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