segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016

Em torno a Guevara VII



Mas também é  preciso considerá-los de uma maneira que apure as conseqüências do que ele diz.Não se pode  ,apesar desta ambigüidade exegética,deixar de confrontar o que aconteceu na Rússia ,onde um estado (totalitário)cresceu enormemente,com as sobejas demonstrações de Marx e Engels quanto à necessidade de não associar o comunismo com o Estado.Vejam esta passagem de Engels no pequeno trabalho “ Sobre a Autoridade”,no auge da polêmica com os anarquistas e principalmente bakuninistas:
“Todos os socialistas concordam em que o Estado político(diríamos  hoje estado hegemônico da burguesia) e com ele a autoridade política desaparecerão como conseqüência da próxima revolução social, ou seja, que as funções públicas perderão o seu caráter político e se transformarão em simples funções administrativas protegendo os verdadeiros interesses sociais(sem hegemonia).”
Se Marx ou Engels concordassem com o estado  soviético ou “ melhor” com o Stalinismo,eu me jogaria (e exigiria que o Che o fizesse  também)da Rocha Tarpéia!Brincadeira!Eu diria que alguém estava mentindo ou que alguém era oportunista ou psicótico ou cínico ou tudo isto!
Na época de Marx e Engels praticamente(praticamente)só existiam as classes burguesa(minoritária)e  o operariado industrial.De uma maneira preconceituosa os dois descartavam o campesinato,que vivia no cretinismo do campo e  o lumpesinato,aqueles que não se encaixavam na sociedade industrial e viviam à deriva.
Como não teorizaram especificamente sobre estas classes é de  se pensar que elas seriam absorvidas e modificadas  pela sociedade comunista.Contudo na época deles , e somente no final do século XIX e  inicio do XX,surgiu uma classe média crescente,mais compreendida pelos social-democratas alemães,que ressaltaram  a  necessidade de incorporá-la ao processo de mudança,só que agora mais na perspectiva da reforma e não da revolução,porque a classe média,com os seus ganhos reais não tem interesse real num processo revolucionário.
Aqui aparece a divisão entre os marxistas,que continua até hoje(e inspira Guevara),entre os que apóiam o esquema marxista tradicional,supostamente vitorioso na Rússia e os  heterodoxos que  enveredam por reconhecerem que as condições mudaram,principalmente no ocidente,mas servindo de modelo para todos os países,que consideram inevitável e necessário o surgimento de uma classe média,uma medida e condição do fortalecimento da moderna democracia.Reconhecem igualmente que a classe operária em muitos lugares teve ganhos deste tipo ,mais do que nos estados socialistas ditos “ reais”.
O que acontece com os setores ortodoxos é  que a classe média parece parasitária do capitalismo e uma sua mantenedora indireta .O capitalismo ,”espertamente”, dividiu as tarefas com setores  sociais antes excluídos,para que não revolucionassem,num processo semelhante ao que ocorreu depois da Comuna de Paris,1871,com a classe operária,cooptada pelo progresso científico (que melhorou as suas condições{daí o grande incremento da ciência})e pelo capitais e matérias-primas vindas das colônias ,notadamente africanas.É bom que se diga aos ortodoxos de hoje,que,segundo Hobsbawn(A Era do Capital)o operário europeu médio deste período apoiou  o neo-colonialismo,pensando mais na sua condição nacional do que no internacionalismo da classe operária...Ninguém da classe operária  defendeu os trabalhadores africanos ou asiáticos e só em duas ocasiões ,havidas nos Estados Unidos e no México se colocaram contra os países centrais:quando da Guerra de Secessão A internacional,presidida por Marx,enviou uma carta de apoio ao Presidente Lincoln(eu vou publicar esta carta proximamente)instando-o a fazer a libertação dos escravos;e no caso de Benito Juárez  a intervenção Austríaca no México.
Mas tudo isto não encobre o fato de que o crescimento da classe média era inevitável e atende não a interesses das classes burguesas(pode  acontecer eventualmente claro),mas ao desenvolvimento do Estado Moderno  com conseqüências na divisão do trabalho.
Se a classe média apoiou o fascismo contra o comunismo em muitos lugares ,em outros ela apoiou o socialismo,a  democracia,dependendo das vicissitudes do lugar e do tempo.
Era bom que doidões como a Sra Marilena Chauí prestassem mais atenção a estes detalhes.Por isso eu não gosto de  socialistas especializados,como a professora de Filosofia.Ela fica no seu metier e não estuda outras disciplinas essenciais  para quem se diz,ainda,revolucionário ou radical(não sei se ela é ainda).Também tais considerações deviam calar fundo na consciência do Lula,que fundou um partido dos trabalhadores para incluir a classe média e fica deixando este pensamento hegemônico radical prosperar dentro do seu partido.
Mas tratamos aqui do Che e dos fundamentos do Marxismo.Ele também é um ortodoxo e seguiu os parâmetros desta limitação.
Dentro do estado de intenção comunista,mas nacional-repressivo,que resultou da Revolução Cubana(seguindo a URSS) ,um dos primeiros atos foi acabar com as disciplinas eruditas,culturais,teóricas,por desimportantes(ato que Pol Pot admiraria)ou não prioritárias e embora com a sua consciência internacionalista ele não saiu deste pântano que se tornou o marxismo após  a morte de  seu fundador.