segunda-feira, 6 de julho de 2015

O prefácio de 1859 II(ou 1857 não sei)



Analisando  o texto  original  nós  vemos  que realmente  há uma  precedência  do  mundo real  sobre  a consciência. Contudo, no desenvolvimento  do  processo histórico o  ato em  si de  identificar  esta  precedência já guarda  autonomia  frente à objetividade.
No  ser  social  está a consciência .
Uma das  frases lá citadas  por  colocar  esta  precedência é  esta:
“Do mesmo modo que não se julga o que um indivíduo é pelo que ele imagina de si próprio, tão-pouco se pode julgar uma tal época de revolucionamento a partir da sua consciência, mas se tem, isso sim, de explicar esta consciência a partir das contradições da vida material, do conflito existente entre forças produtivas e relações de produção sociais.

Mas  este trecho  revela que  Marx  ainda   é de  antes  da  sociedade   da produção cultural
e  de Freud,porque  ele  parte do  pressuposto  de que o  individuo   não se  define  por  si  mesmo.Assim  como o ser  não  se  define  por  sua  auto-imagem o  ser    se define  por suas  relações  sociais.O  ser  dotado de  consciência,no  entanto  guarda  sim autonomia,pois  ele não  é    objeto da  ciência  social  mas  ser  de sentido,subjetividade.
Por  isso  digo  que apesar de  Marx   é  possível  construir um  dialética entre o ser  social  e  o ser,incluindo  este  sentido,estes  discursos,todos  os  meios  de expressão  da  subjetividade,todas  as  transcendências ,que  Marx  não  teorizou.
Não podia,talvez,teorizar  ,mas  este  fato  prejudicou a  sua  entrada  no  século XX.
Depois  de  Freud,de  Saussure  é  praticamente impossível  não trabalhar com  a autonomia  do sujeito  e  não ver  as  limitações de  Marx , principalmente  neste  prefácio.
É  lógico que  as  relações sociais  formam o  sujeito mas  este  adquire  mais e  mais  autonomia e passa a  ser  um  problema  filosófico(e de  outras  naturezas progressivamente)em  si  mesmo.
O sujeito  não  conhece a  si  mesmo,pois está no  movimento,mas  é possível construir  uma  auto-imagem autêntica,dir-se-ia verdadeira,no sentido  de  que expressa  algo  real  para  ele.
A auto  compreensão do  sujeito por sua  libertação  não se  dá nas  relações sociais  somente,mas  nelas e  nele  mesmo,porque  sem  ele não  é  possível.As relações sociais são meio,ele é finalidade.
O  problema é quando  o  sujeito  não  está livre nas  relações sociais,como  dar  autenticidade  a uma existência de  escravo?De explorado,na sociedade capitalista?
Para  Marx a  existência do escravo não  é autêntica,impondo  dialeticamente(por sua tomada  de  consciência)sua  libertação.
Segundo  ele esta  mudança    ocorre quando forma e  o  conteúdo de  um  sociedade entram em  contradição (de  novo  Marx  é  um  aristotélico).É  neste  contexto que  o escravo se  torna  livre.No caso  do comunismo,superando definitivamente a forma da  exploração ,o ser  humano  se  integra  em  si  mesmo,se realiza.
Então  toda  existência no capitalismo e  em todas as  formas de  exploração conhecidas  na história  não  há autenticidade.As relações  de amor, arte, política ,nada tem  valor(sentido)?
Esta  incompreensão de  Marx   nos  força  a dizer novamente que é  necessário ,contra  ele, colocar  novas  categorias  para preservar o seu  pensamento  ,o  materialismo histórico,dizendo  que é na autenticidade da  forma,na   autonomia da forma ,  que  se pode  fazer  isto,quer dizer,incluir  e legitimar estas manifestações subjetivas,para ele,formas de consciência  social.
É  lógico  que a visão  do individuo é  limitada.É   lógico  que o sujeito, muitas  vezes ,acha que  sua  visão  é  que explica  o  mundo,mas  é o mundo que  condiciona  o  seu método,os seus  valores  e atitudes e  isto  distorce  sua  visão,mas  nem nas  sua relações  consigo próprio  e de  si  com  o  mundo,com a objetividade,se há de  inquinar de absoluta  ilegitimidade a contribuição do  conhecimento subjetivo, a não  ser  quando se mostra a  sua  total  inadequação,a inadequação entre o sujeito e  o objeto.Isto porquê a subjetividade não tem como abarcar  o  conhecimento  objetivo,in totum.Ele  não restitui a realidade,pela linguagem,por  menor que  seja o seu objeto de investigação.
Dizer que ,da  mesma  forma que  não é  a auto imagem do  sujeito que  define  o mundo,  não  é  o  ser que  define  as  relações  sociais,peca  por  confundir  dois  níveis  de  compreensão,a auto- consciência   da subjetividade,sobre si  mesma , e desta  na relação  com  o  mundo.
E  isto  acontece  porque  Marx   não  tinha  elementos  para  entender que  a subjetividade  é  uma realidade possível de   conhecimento de per  si.
Com a  troca  simbólica da  sociologia,com Saussure e a  linguagem,  e Freud ,é  possível  uma  subjetividade autônoma ,influenciada  pelas  relações  sociais mas  não só  mera  expressão delas.
Não   é  superestrutura mera expressão da  infraestratura .Não é  mero reflexo como

terça-feira, 16 de junho de 2015

O prefácio de 1859




O  prefácio de  1857,que  diz  a  frase  obsessiva;"não  é  o ser  que  gera  o ser  social  ,mas  o  ser  social  que  gera  o  ser",bem  poderia  ser  dita  assim:"não é  o  sujeito que  gera    as relações  sociais,mas  as  relações  sociais    é  que  geram  o  sujeito".Pois  o ser,no  sentido de categoria  filosófica,  physis  engloba  toda uma  materialidade,uma  experiência.O  ser  está  contido nesta experiência,que  é existência,subjetiva e objetiva.é  a  experiência  que  fundamenta  a transcendência  humana,real.
  Transcendentalidade ,como  algo  apartado  da  experiência,é  uma  teoria  da  religião,não  comprovada,pois a  experiência é  concreta , não  se  rompe  e é,como experiência,  material  também.
É lógico  que  a  subjetividade  não  vem antes do  mundo,mas  não  está  fora  dele,como a família  ,que cria  os  filhos  para  o  mundo,mas  não  está  fora  dele.Existe  uma distinção mas,dentro da  dialética e da  aufhebung eles  se integram  na experiência.
Na  URSS,por  necessidade da ideologia , esta  visão foi  simplificada por uma  impossível  identificação com a  reflexologia  de Pavlov,pela  qual se  substituiu  esta  aufhebung  Ser/Ser  Social pela   dicotomia  infraestrutura/superestrutura,em  termos  de  que  a  primeira fundamenta a segunda   ,a qual  seria  reflexo  dela, matando  assim  a dialética.Na  visão  de  Marx    realidade  social  é a  síntese   de múltiplas  determinações,que  se  desintegram e integram  permanentemente.
A relação Ser/Ser  social é  pois  determinação  recíproca não  espelhamento.É  um  processo.
Dentro  desta  concepção é  possível  pensar um resignificação  do materialismo  histórico  a partir  da  transcendência ,ainda  que isto seja realmente estranho  a  Marx,porque é  possível que discursos  subjetivos  autônomos sejam possíveis  e explicáveis materialísticamente,pois  idéias  e relações sociais   são  experiência  material  humana.
É possível um transcendente sem o  transcendental(sem a  religião).

Amigos eu resolvi acrescentar em português e em alemão o Prefácio de1859(eu errei,eu  sei,kkkkk),analisado acima
em português:
Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, inversamente, o seu ser social que determina a sua consciência. Numa certa etapa do seu desenvolvimento, as forças produtivas materiais da sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes ou, o que é apenas uma expressão jurídica delas, com as relações de propriedade no seio das quais se tinham até aí movido. De formas de desenvolvimento das forças produtivas, estas relações transformam-se em grilhões das mesmas. Ocorre então uma época de revolução social. Com a transformação do fundamento económico revoluciona-se, mais devagar ou mais depressa, toda a imensa superstrutura. Na consideração de tais revolucionamentos tem de se distinguir sempre entre o revolucionamento material nas condições económicas da produção, o qual é constatável rigorosamente como nas ciências naturais, e as formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou filosóficas, em suma, ideológicas, em que os homens ganham consciência deste conflito e o resolvem. Do mesmo modo que não se julga o que um indivíduo é pelo que ele imagina de si próprio, tão-pouco se pode julgar uma tal época de revolucionamento a partir da sua consciência, mas se tem, isso sim, de explicar esta consciência a partir das contradições da vida material, do conflito existente entre forças produtivas e relações de produção sociais. Uma formação social nunca decai antes de estarem desenvolvidas todas as forças produtivas para as quais é suficientemente ampla, e nunca surgem relações de produção novas e superiores antes de as condições materiais de existência das mesmas terem sido chocadas no seio da própria sociedade velha. Por isso a humanidade coloca sempre a si mesma apenas as tarefas que pode resolver, pois que, a uma consideração mais rigorosa, se achará sempre que a própria tarefa só aparece onde já existem, ou pelo menos estão no processo de se formar, as condições materiais da sua resolução.
Em alemão :
" Es ist nicht das Bewußtsein der Menschen, das ihr Sein, sondern umgekehrt ihr gesellschaftliches Sein, das ihr Bewußtsein bestimmt. Auf einer gewissen Stufe ihrer Entwicklung geraten die materiellen Produktivkräfte der Gesellschaft in Widerspruch mit den vorhandenen Produktionsverhältnissen oder, was nur ein juristischer Ausdruck dafür ist, mit den Eigentumsverhältnissen, innerhalb deren sie sich bisher bewegt hatten. Aus Entwicklungsformen der Produktivkräfte schlagen diese Verhältnisse in Fesseln derselben um. Es tritt dann eine Epoche sozialer Revolution ein. Mit der Veränderung der ökonomischen Grundlage wälzt sich der ganze ungeheure Überbau langsamer oder rascher um. In der Betrachtung solcher Umwälzungen muß man stets unterscheiden zwischen der materiellen, naturwissenschaftlich treu zu konstatierenden Umwälzung in den ökonomischen Produktionsbedingungen und den juristischen, politischen, religiösen, künstlerischen oder philosophischen, kurz, ideologischen Formen, worin sich die Menschen dieses Konflikts bewußt werden und ihn ausfechten. Sowenig man das, was ein Individuum ist, nach dem beurteilt, was es sich selbst dünkt, ebensowenig kann man eine solche Umwälzungsepoche aus ihrem Bewußtsein beurteilen, sondern muß vielmehr dies Bewußtsein aus den Widersprüchen des materiellen Lebens, aus dem vorhandenen Konflikt zwischen gesellschaftlichen Produktivkräften und Produktionsverhältnissen erklären."

Como   se  pode   observar existe  sim  um  " desnível"entre   superestrutura  e  infraestrtura ,mas  não impede que mais embaixo ele diga que a tomada de  consciência determina  também  o modo  como se resolverão as contradições   de  uma  época.

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Gyorgy Lukács

ou  uma  no  cravo  outra  na  ferradura.




Lukács   foi  um  dos  mis  importantes  pensadores  marxistas do  século  passado,chegando a
substituir  Stalin   como o  "  quarto  clássico"  do  marxismo ,justamente  por  uma  crítica  famosa  ao  ditador.Contudo  ele  mesmo não  escapa de uma  crítica  por  suas  ligações  com  ele,porque  por trás  de  um célebre  conceito que  ele  emitiu  sobre literatura existe  algo  muito  falso e  autoritário.Refiro-me  à idéia  de  que  um escritor pode  ser  de  direita  pessoalmente  e  de esquerda como artista.
Esta afirmação remonta ao  conceito  antigo de despotismo  esclarecido e  não é  novo,portanto.
É  um  modo  de  cooptação de  seu  inimigo através  do  reconhecimento  e manipulação  de  sua inocuidade política.
Os  filósofos  iluministas  do   século XVIII,Diderot  Voltaire  eram  críticos   ferozes dos  déspotas e  monarcas absolutos.Com  o  crescimento da  cultura  estes  déspotas  perceberam
claramente    que  entrar  num acordo  com esta  cultura era  mais  interessante  do  que  a simples   repressão.Era um  jogo  que  acabava  por  ajudar  o  déspota no  seu esforço de legitimação.Porque  a cultura  modificava  o  mundo  indiretamente,os  poucos enquanto  que  os  métodos   políticos   são  mais  rápidos e  perigosos(para  os  monarcas  ).
O  crescimento da  cultura  tem   ver  com o  igual  crescimento  da  classe burguesa
na  Europa  e  esta é  cooptável  de diversas  maneiras  até  pelo  respeito  ao saber  intelectual
como  um  comportamento  nobre  e não  esnobe.
Os  reis,agora  chamados  de  "  déspotas  esclarecidos" cooptam  estes  intelectuais
que  confiam  e  propõem   reformas  liberais e  legitimam  um  poder  que não
muda  senão  muito  superficialmente.
Este  estágio do  despotismo esclarecido  preprara  o campo  para  as  futuras  monarquias
constitucionais,mas  no  seu  tempo  favorecendo  aos  reis  mantendo  o seu  poder .
Tanto  Francisco  José  na  Aústria,como  Catarina  II da  Rússia e  Frederico  o  Grande  da  Prússia só  acabaram com  os  torturas,mas a   estrutura,aristocrática,  que  os  sustentava  no poder  continuou até   mais  firmemente.
Se  repararmos  o conceito  de  Luckács  sobre    a pessoa  do  artista e   as  obras,ele obedece  idêntico  propósito.Da  mesma  forma  que os  Diderot e  Voltaires  do  século XVII eram  rebeldes    sua  obra  podia servir  aos  reis,por  seus  conteúdos  serem  tidos  como verdadeiros  e úteis(para  os  reis),assim  para  Luckács o  critério pessoal de direita  dos  escritores  se  distancia  das  verdades  ditas  por  eles porque o  que eles  revelam e denunciam coincidem pelo  que  diz  a  esquerda.
Eles  eram ,pois  de esquerda,no que  interessava  á  ela.
Nelson  Rodrigues  era  católico anticomunista,mas  ao  denunciar  s  contradições do seu  meio  casava  perfeitamente  com o caminho  comunista!
Isso  significa  que  as  denúncias  feitas  por  ele  contra  o stalinismo  não  têm relevância(como  os  reis,  os  comunistas  se beneficiam deste  truque).Muito  stalinista  no Brasil  põe  Nelson debaixo  do braço e  se  passa  por um  grande democrata...A  direita  não  diz  verdades...
O  grande  Luckács,que  fez  a critica  famosa  contra  o stalinismo  denunciando  os  "  pequenos  stalins"reproduziu(inadvertidamente?)um  dos  seus  métodos,tirado  do despotismo esclarecido,usado  na época  da " coletivização  forçada",quando
Stalin  reprimiu  a Ucrânia  e simultaneamente  trouxe  os  intelectuais  de volta  do  exílio  com regalias  e  direitos  plenos para  depois escondê-los e fazer algo  pior.
Como  os reis, Stalin ( e Luckács)davam uma no cravo e  outra na ferradura.